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GT 028. Conflitos, Práticas Estatais e Mobilização Social no Brasil contemporâneo

Manuela Souza Siqueira Cordeiro (UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA) - Coordenador/a, Katiane Silva (Universidade Federal do Pará) - Coordenador/a, Paula Mendes Lacerda (UERJ) - Debatedor/a, Marta de Oliveira Antunes (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) - Debatedor/a, Rhuan Carlos dos Santos Lopes (Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira) - Debatedor/a

O GT tem como proposta reunir trabalhos que tematizem processos e dinâmicas em torno de conflitos sociais. Compreendemos o conflito como um momento que pode desencadear mobilizações sociais, caracterizadas pelo estabelecimento e negociação de poder entre coletivos políticos ou entre estes e o Estado. Além dessa dimensão que, por sua vez, se desdobra em categorias que pretendem descrever formas específicas de violência como a “violência estatal”, a “violência contra a mulher”, o “genocídio”, os “massacres” e “conflitos no campo”, buscaremos contemplar também o conflito em sua dimensão processual ou genealógica, atentando para os mecanismos por meio dos quais as diferenças e desigualdades se fundam e perpetuam. Pretendemos também abarcar trabalhos que estejam discutindo ações de coletivos políticos que se constituem ou se reorganizam frente a situações consideradas injustas, desiguais ou violentas, de maneira a perceber como estes vislumbram a possibilidade ou a expectativa de reparação pelas violações sofridas. Trata-se, portanto, de um GT que espera se compor a partir de uma diversidade de situações etnográficas que tenham como proposta discutir mobilizações sociais nas cidades, no campo, em comunidades indígenas.

Resumos submetidos
"Mortos e desaparecidos políticos”: a construção da “vítima” nas comissões da verdade vinculadas ao período ditatorial no Brasil
Autoria: Maria Julieta Ramallo Garcia
Autoria:

O Brasil viveu, de 1964 a 1985, um período de regime ditatorial, durante o qual foram cometidas inúmeras violações dos direitos humanos, cujo saldo de mortos e desaparecidos políticos é de grande expressão. Para muitos autores, pouco se avançou na questão de elucidar as violações cometidas nesse período; no entanto, nos últimos anos ocorreram certos fatores que ajudaram no processo da criação da Comissão Nacional da Verdade, em novembro de 2011, através da Lei n. 12.528, e de outras comissões estaduais. Para Sarti (2014) o Brasil voltou-se, desde o início, para as políticas de reparação de caráter indenizatório, evitando, assim, esclarecer os fatos e a utilização penal e judicial para julgar os responsáveis pelos crimes cometidos na ditadura, que, segundo a autora, legou a figura da vítima um lugar indefinido. No entanto, com a criação da Comissão Nacional da Verdade (CNV), em 2012, os lugares da vítima e da testemunha foram colocados em outro plano, já que buscava-se revelar outra versão da história dita oficial (2014: pg. 94). Entretanto, a construção dessa memória não é singular, mas plural. A autora utiliza o argumento da socióloga argentina Elizabet Jelin, que se volta para a impossibilidade de se encontrar “a” memória, isto é, “o cenário das lutas políticas pela memória não é simplesmente um confronto entre memória e esquecimento, se não entre distintas memórias” (2003: pg. 16 apud SARTI, 2014: pg. 97). Nesse sentido, o sociólogo Lucas Pedretti se pergunta: “a comissão da verdade reforçou ou questionou determinadas marcas das memórias hegemônicas sobre o período? (PEDRETTI, 2017: pg. 65). Nesse contexto, o presente work visa analisar a categoria “mortos e desaparecidos políticos” e os critérios que a definem, a partir da perspectiva das comissões da verdade que surgiram após o fim do período ditatorial, mais especificamente a Comissão Nacional da Verdade (CNV) e a Comissão Estadual da Verdade-RJ (CEV-RIO). O objetivo do work é, a partir da análise dos relatórios, documentos e publicações produzidos pelas comissões, e de entrevistas com integrantes das próprias e de pessoas afetadas ou vinculadas a elas, inquirir o que define e como se constrói uma “vítima do estado ditatorial”.

A contenção do conflito. Vigilância, controle, e intermediação dos guardas de rua, num bairro residencial em Porto Alegre.
Autoria: Maya Benavides del Carpio
Autoria: A partir duma etnografia realizada com guardas de rua, num bairro residencial de Porto Alegre, ressaltam-se as habilidades, técnicas, recursos e ferramentas mediante as quais, eles conseguem ser reconhecidos como um elo da vigilância e controle da segurança privada, tanto pelos clientes que os contratam quanto pelas diversas pessoas que transitam as ruas, e os agentes da segurança pública. Graças a esse reconhecimento, os guardas de rua realizam uma intermediação entre as diferentes pessoas que habitam e transitam o bairro. Tomando em conta que esses guardas são atores não estatais, e são uma das faces menos formalizadas da segurança privada, suas práticas de vigilância e controle, estão localizadas nas margens do Estado, lugar desde onde sua intermediação age contendo o conflito entre as camadas sociais e, ao mesmo tempo, perpetuando as diferenças e hierarquias entre elas.
A Polícia e sua Filtragem: Uma análise dos diacríticos policias na cidade de Barbacena.
Autoria: Marcelle Luiz de Andrade
Autoria:

Este work tem como objetivo a realização de uma breve análise antropológica, de uma pesquisa ainda em andamento, sobre como os discursos e as práticas da segurança pública se relacionam no espaço público no Brasileiro, mas especificamente na cidade de Barbacena em Minas Gerais. Trago um debate em torno da atuação da Polícia Militar de Mina Gerais (PM/MG), no tocante a abordagem do suspeito, principalmente o observado nas periferias em suas práticas cotidianas. O breve estudo aponta que existe uma seletividade no olhar do policial em sua atuação, o objetivo é compreender quais são estes diacríticos e como eles se transferem dentro da polícia, por meio de seus agentes, e refletido nas ruas. Deste modo, é notório uma análise e um questionamento sobre as práticas empregadas por esses policias em suas abordagens, refletindo assim na visão das políticas públicas, é de suma importância analisar e estudar a abordagem policial, para que cada vez mais esse tema seja discutido no cenário acadêmico e social.

Campos de disputa em Tucuruí: Regimes de verdade que moldam a constituição de ações coletivas
Autoria: Rodica Weitzman
Autoria: Este work tem o principal objetivo de analisar o processo de organização e luta dos atingidos pela UHE de Tucuruí durante diferentes fases de intervenção da empresa hidrelétrica, anterior e posterior a 1985, tendo como foco a relação dinâmica entre a ação estatal e as reações da população atingida. Conflitos entre diferentes forças sociais (SIGAUD, 1992) eclodiram dentro do espaço social afetado pela construção da barragem, a partir dos deslocamentos compulsórios de moradores; dos problemas socioambientais gerados; e das negociações árduas para a efetivação das indenizações e o processo de reassentamento das comunidades atingidas. Cabe salientar que a geração da hidreletricidade no Brasil, até a proclamação da Constituição de 1988, foi fruto de decisões tomadas conjuntamente pelo Setor Elétrico e o Poder Executivo dentro de um processo de co-gestão, de modo que as fronteiras entre os agenciamentos estatais e empresariais fossem acinzentadas, especialmente durante o período do regime militar. O saber técnico se faz presente no conjunto de “papéis” (inquéritos, planilhas e questionários) que constituíram o principal veículo da ação intervencionista da Eletronorte, a instituição responsável pela obra, na medida em que comunidades eram enquadradas como alvos de “mapeamentos” e “cadastramentos”, sendo sujeitadas à mensurações, cálculos e estimativas. A partir deste enfoque no viés “instrumental” dos documentos fabricados, é possível vislumbrar de que modo os mesmos se tornam mecanismos disciplinares que auxiliam o aperfeiçoamento de sua expertise e a imposição de uma “ordem normativa” no conjunto do corpo social. O discurso tecnicista que perpassa os documentos produzidos se dedicou a dissolver as tensões em jogo, dentro de uma estratégia voltada para apaziguar conflitos e promover a suposta “neutralização” e despolitização dos processos. A luta travada pelas configurações embrionárias dos Atingidos no final dos anos 70 e início dos anos 80 se opõe ao tratamento raso que norteia os documentos, instrumentos e táticas empregados no plano de intervenção do Setor Elétrico – uma abordagem que desconsiderava as especificidades de cada segmento de acordo com sua condição social, seus meios de sobrevivência e sua localização dentro do território. A partir de atos de contestação, embate, conciliação e costura política, posições e táticas foram continuamente reformuladas no bojo de um processo de negociação incessante com a Eletronorte e suas forças aliadas. Assim, testemunhamos o dinamismo de um movimento heterogêneo forjado a partir da promoção de “formas de socialização política”, ora “performances coletivas”, ora “interações”, que reforçaram “solidariedades e identidades coletivas.” (MEDEIROS, 2012, p. 24)
Conflito e Colonização: a biografia da Colonização de Buriticupu a partir de um recorte antropológico de identidade individual e social de um colono.
Autoria: Thimóteo de Oliveira Cardoso
Autoria:

Ao considerar as características que permeiam o “nascimento” da cidade de Buriticupu no Estado do Maranhão logo se evidencia o fato de que tal município é fruto de um projeto de colonização do governo federal na década de 1970. Tal processo de povoamento foi marcado por intensa midiatização enfatizando a ação estatal, muito embora, também foram intensos os conflitos de terra envolvendo grupos sociais da região sudoeste do Maranhão que também propiciaram a consolidação de uma comunidade. Logo, colonização e conflito são categorias que permeiam a construção do imaginário do período de formação e consolidação do que viria a ser a cidade acima citada. O discurso oficial sobre tal período é forjado a partir de grupos de interesse diferenciados do estado do Maranhão, o mesmo é explicito nos diários jornalísticos de Imperatriz e da capital do Estado, São Luís. Uma espécie de senso comum douto se ancora num discurso privado jornalístico que resulta no delineamento da “história”. Temos como objetivo presente estabelecer uma comparação entre o discurso oficial, extraído dos jornais da época e cinco discursos, em suas características que tangem à memória coletiva, de “indivíduos fundadores” da cidade. Um personagem (moradora que vivenciou a colonização) foi escolhido como parâmetro de análise dos vários discursos oficiais e não oficiais. Uma espécie de biografia da colonização será recortada não pelo Estado nem por movimentos típicos anti-estatais, mas pela forma como tal colono constrói a sua identidade e a identidade social do município a partir da reinterpretação de discursos. Considerar-se-à que os múltiplos discursos devem ser avaliados em consonância com a posição social, analisados em seus “recortes e limites”. Utilizando Foucault (2008) e Bourdieu (2009) e suas perspectivas críticas à análise do discurso per si, defendemos nesta pesquisa a consideração do discurso enquanto difuso, anti-linear, repleto de rupturas que conduzem à quebra e colocam em xeque à tradição de determinada fala oficial. Pesquisa do tipo puro, explicativa e utilizando a abordagem de pesquisa de memória coletiva, esclarecida por Maurice Halbawachs (1990) direcionamos nossa investigação para a análise de discursos de cidadãos fundadores da cidade com o objetivo de construir um relato sobre o processo de colonização considerando a memória enquanto social e refletindo uma perspectiva de consciência coletiva. Algumas personalidades serão escolhidas de modo a considerar os diferentes posicionamentos que ocupam atualmente assim como a posição ocupada no contexto estudado. Far-se-á análise comparativa entre os discursos dos indivíduos e os discursos oficiais.

Conflitos entre o antes e o agora: o território do Lago Grande do Curuai em “disputas”
Autoria: Maria Alice Costa de Oliveira
Autoria: O work resulta da realização de pesquisa na comunidade de Ajamuri, localizada no Lago Grande do Curuai, município de Santarém-PA, na oportunidade de participação no Projeto de Pesquisa “Etnicidades, Práticas Culturais e Formas de Organização Social em um Contexto Regional do Baixo Amazonas”, coordenado pela Prof.ª Dr.ª Eliane Cantarino O’Dwyer. Ajamuri desvelou três grandes questões que afetam a todos os seus moradores de forma direta e indireta – a perspectiva de alteração do modelo de Projeto Agroextrativista PAE Lago Grande para a titulação individual, por meio do Programa Terra Legal; a reformulação da Instrução Normativa nº 30/2004/IBAMA, que regula a pesca no Lago Grande, de modo a favorecer a pesca comercial; e a sobreposição de áreas da comunidade a partir da delimitação da TI Cobra Grande, que contempla indígenas das etnias Arapium, Jaraqui e Tapajós. Em cada um desses eixos se configura um conflito macro e seus desdobramentos, seja nos discursos contrários ou na iminência de litígios diretos. No centro destas questões encontra-se o território, espaço de disputas políticas, econômicas, de identidades e papéis sociais e de memórias e pertencimentos. Por meio desse mesmo território, diferentes sujeitos constituem suas vivências, subsistência, práticas culturais e estratégias de bem viver e, para suprir essas e tantas outras necessidades, o território é sempre acionado, pois que é salutar à manutenção de sujeitos e recursos. Desta forma, o território constitui-se como o centro das disputas e conflitos atuais, numa teia complexa de interesses que ora unem, ora divergem; ora individualizam, ora coletivizam; em que as mudanças são usadas tanto para justificar transformações como para valorizar um passado que se entende ser melhor que a atualidade em alguns aspectos. O antes e o agora, assim, são acionados em diversas narrativas e por diferentes sujeitos: o indígena em processo de etnogênese e que luta pelo reconhecimento de seu território de ocupação tradicional; o agricultor, que rememora o uso produtivo de seu lote sem as limitações impostas hoje pelo modelo de assentamento; e o pescador, saudoso da fartura do Lago Grande e, contraditoriamente, defensor da flexibilização das normas, que favorecem a sobrepesca. As “disputas”, assim, são diversas, pois esse território é multifacetado e contempla processos de territorialização e territorialidades também distintas. Pensar essa diversidade de territórios dentro de um território; de sujeitos; de práticas e de conflitos; e como o antes e o agora são acionados para legitimar suas demandas é o objetivo deste texto.
Direitos territoriais e emergências étnicas indígenas no Pará
Autoria: Katiane Silva
Autoria: É na região conhecida como Planalto Santareno onde vivem os indígenas Munduruku do Planalto, como se denominam, e estão passando por um processo de emergência étnica e enfrentamento ao avanço do agronegócio, representado principalmente pelo cultivo da soja. A área estudada abrange tanto a várzea quanto terra firme, onde vivem 607 pessoas indígenas em quatro aldeias: Açaizal (145), Ipaupixuna (268), São Francisco da Cavada (150) e Amparador (44). A população desenvolve a agricultura, a pesca, criação de animais e prestam serviços nas fazendas nos arredores, caracterizando também pela relação de patronagem. Desde a primeira metade dos anos 2000, os Munduruku vêm organizando um movimento de reconhecimento de sua condição étnica e em 2012 a Funai fez a qualificação preliminar do território. No documento produzido pela instituição foram apresentados os seguintes problemas: assoreamento e contaminação (por agrotóxicos utilizados na soja) do igarapé açaizal; contaminação e morte de animais; contaminação do ar (pulverização de venenos) pressão de fazendeiros – “cercamento das aldeias”; desmatamento pela soja; impedimento da mobilidade social e o direito de ir e vir; assédio para compra de terras; destruição de áreas de sítios arqueológicos; entre outros. Neste work pretendo descobrir, três aspectos principais interconectados: a) regularização fundiária e demarcação de uma Terra Indígena; b) as consequências nocivas do avanço do cultivo da soja à saúde dos indígenas e quilombolas e ao meio ambiente; c) sobreposições territoriais em terras tradicionalmente ocupadas por indígenas e quilombolas Durante a primeira etapa de campo realizada em junho de 2018, foi possível perceber que a organização e mobilização dos grupos domésticos da região, sejam indígenas ou quilombolas, fazem resistência ao “projeto colonizador” da Amazônia, que vem se constituindo com base na violência, tanto física quanto simbólica, enquanto elementos constituintes da "domesticação" e exploração da região estudada. Nesse sentido, A questão da delimitação das fronteiras (sociais e burocráticas) e configuração territorial do caso apresentado deixa claro que essas fronteiras não se reduzem simplesmente às características naturais ou a um programa de desenvolvimento regional, como afirmam alguns representantes dos produtores rurais, mas são determinadas por um corpo de relações que ultrapassam esses muros naturais e estão fundados na mobilidade e na troca de informações, da reputação e alianças, na luta contra os processos de dominação nos âmbitos local e global.
Entre balas de fuzil e bombinhas de São João, quem tem direito a terra? Estudo de caso do acampamento Enilson Ribeiro - RO
Autoria: Clarissa Machado de Azevedo Vaz, Lenir Correia Coelho
Autoria: O presente artigo buscar analisar a resistência dos camponeses do Acampamento Enilson Ribeiro, localizado no município de Seringueiras, região norte do país, onde no processo de ocupação do latifúndio, em 2015/16, a assessoria jurídica dos acampados, se depara com uma Ação Reivindicatória movida pelo INCRA em desfavor do suposto fazendeiro. A ação reivindicatória tramitava desde 2007, porém, até o momento da ocupação, não havia sentença de primeiro grau. Ainda que, com fortes indícios de que se tratava de terra pública, o suposto fazendeiro consegue mover todo um aparato contra os acampados. Primeiro foram os fazendeiros da região que se uniram para reivindicar, fechando a rodovia e as possíveis entradas para o acampamento. Segundo foi a velocidade em que conseguiu uma liminar de reintegração de posse, mesmo sem conseguir provar a posse e a propriedade, com determinação de utilização de força policial (até mesmo do exército) para a desocupação do imóvel. Em terceiro lugar, o papel exercido pela força policial, militar, civil, força nacional. A utilização de força desnecessária, verdadeiro cenário de guerra. Após mediação do Ministério Público Federal, houve a retirada dos acampados e um acordo foi firmado, para que, após a resolução da propriedade da terra, caso se confirmasse que se tratava de terra pública, o local seria destinado para a reforma agrária, onde seriam beneficiados os acampados e os participantes do movimento social de reivindicação de terras. Em 2018 a ação declaratória movida pelo INCRA, chegou ao final, e confirmou a alegação de que se tratava de terra pública, e que, portando, a posse seria do INCRA para que fosse destinado à reforma agrária. Entretanto, em 2017 houveram mudanças na legislação que estabelece o procedimento de escolha das pessoas que poderão ser beneficiadas com a reforma agrária. Os camponeses voltam a ocupar a fazenda, contabilizando mil e cem famílias e, dessa vez, o INCRA é quem reivindica judicialmente a sua saída. Tendo como tema: entre “balas de fuzil e bombinhas de São João: quem tem direito a terra? Estudo de caso do acampamento Enilson Ribeiro” mostra que a violência sofrida pelos acampados no conflito por terra no Brasil, e, especialmente no Norte do país, possui caráter poroso, mostrando que o agronegócio não funciona sem o auxílio do Estado, e este, mantém o monopólio da violência legal, da força política e conivência do judiciário. O problema de pesquisa: “Quem tem direito a terra”? Busca-se tratar de forma crítica, as dimensões do conflito agrário atual, utilizando como análise os acampados do acampamento Enilson Ribeiro que se organização através do movimento social de reivindicação por terra Liga dos Camponeses Pobres.
Escaninhos da Política e Disputas na Produção de Legalidades na Mineração: agentes, estratégias e discursos na modificação do Código Mineral no Brasil
Autoria: Laís Jabace Maia
Autoria:

As Medidas Provisórias 789, 790 e 791 foram apresentadas em julho de 2017 pelo Poder Executivo como desdobramentos do Projeto de Lei do Novo Código Mineral, que estava em formulação há alguns anos e havia sido apresentado para tramitação no legislativo em 2013. As MPs tratavam respectivamente da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) - espécie de royalty pago pelas mineradoras -, do escopo do Código Mineral até então vigente no Brasil e da criação da Agência Nacional de Mineração. Desmembrar a proposta do Código Mineral e tramitar em regime de urgência foi a estratégia encontrada de apressar as modificações que não obtinham maioria no Projeto de Lei em alinhamentos de perspectivas e interesses em torno dos três eixos. Organizaram-se na disputa pela opinião pública, apoio político e interferência no conteúdo das propostas diversos setores da sociedade civil. Destacaram-se, com atuações bem distintas e perspectivas inconciliáveis, o Movimento pela Soberania Popular da Mineração e o Instituto Brasileiro de Mineração/empresa Vale. Para pressionar a aprovação de aumento dos royalties e redistribuição entre os entes federativos, durante meses houve caravanas, reuniões e acordos de representantes do poder público, especialmente alguns governadores e prefeitos do Pará, Maranhão, Minas Gerais e Espírito Santo. O presente work é um esforço de análise das negociações e conflitos acerca da discussão e deliberação no Congresso Nacional durante o segundo semestre de 2017 no que diz respeito à regulamentação, produção e taxação das atividades minerárias no Brasil. A proposta é entender as alianças e os exercícios de poder que se fizeram e os discursos acionados durante a disputa, percebendo assim os mecanismos presentes nos jogos de poder para definição das legalidades para as atividades minerárias. Foram realizadas entrevistas com deputados federais, presidentes de partidos e assessores que se destacaram durante o processo de debate nas Casas Legislativas; analisadas as declarações feitas em plenária de políticos, especialistas, movimentos sociais e representantes da iniciativa privada; e artefatos documentais que circularam no período com o objetivo de delinear as forças, agentes e alinhamentos. Entende-se que elaborar esse campo é um modo de compreender os artifícios mobilizados e praticados dentro do aparato legal brasileiro.

Estado, Igualdade Racial e Movimento Negro: Notas etnográficas sobre experiências de promoção da igualdade racial no estado do Rio de Janeiro
Autoria: Natalia Sales
Autoria: Agentes ligados a movimentos negros vêm, há algumas décadas, protagonizando lutas, no Brasil, pela inserção da questão racial nas pautas concernentes a órgãos vinculados à administração pública, seja federal, estadual ou municipal. A instituição da Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), em 2003, contribuiu para a criação de diversos órgãos do tipo em âmbito estadual e municipal, orientados para a realização das chamadas políticas de promoção da igualdade racial. O estado do Rio de Janeiro é o quarto estado do Brasil que possui mais instituições do gênero, abrigando vinte dos chamados “órgãos PIR”. Entre eles, encontra-se a Superintendência de Promoção da Igualdade Racial (Supir) do estado do Rio, e, vinculado à ela, está, além de conselhos municipais, o Conselho Estadual dos Direitos do Negro (Cedine) que, em breve, também receberá o complemento “PIR” em sua sigla, tornando-se Conselho Estadual dos Direitos do Negro e Promoção da Igualdade Racial (Cedinepir). Com o presente work, objetivo refletir sobre alguns dos principais dilemas enfrentados por militantes representantes de movimento negro que ocupam espaços de promoção da igualdade racial no Rio. Entre esses dilemas, destaco a promoção de atividades orientadas para o combate às desigualdades raciais em meio a espaços com poucos recursos financeiros e estruturais; as visões, muitas vezes contrastantes com as dos militantes da causa anti-racista, dos representantes do Estado acerca das pautas caras ao movimento negro brasileiro; os diferentes sentidos de política acionados pelos representantes do movimento e o modo como são mobilizados perante os agentes do Estado; entre outros. Para essa tarefa, guio-me na etnografia realizada durante a minha pesquisa de mestrado junto aos militantes que atuavam no Conselho Municipal de Defesa dos Direitos do Negro e Promoção da Igualdade Racial e Étnica (Comdedinepir), do município fluminense de Duque de Caxias, e em dados de campo da pesquisa em andamento, junto ao Conselho Estadual dos Direitos do Negro (Cedine), citado anteriormente.
Fica Vivo! Estigmatização e Território: análise de uma política pública de prevenção de homicídios a partir das oficinas oferecida a jovens “vulneráveis”
Autoria: Angelina Moura Parreiras e Silva, Ana Beatriz Vianna Mendes
Autoria: O artigo busca compreender os impactos da implantação do Programa de Controle de Homicídios – Fica Vivo! no bairro Rosaneves, localizado na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Busca-se problematizar questões relacionadas à estigmatização dos jovens e do território, bem como o papel dessa política pública diante da violência na região. Em 2003 o Governo do Estado de Minas Gerais criou esse Programa, baseado no modelo de prevenção à criminalidade elaborado pelo Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da Universidade Federal de Minas Gerias (CRISP/UFMG). Estudos conduzidos por este Centro apontaram que eventos criminosos são gerados por um conjunto de fatores que o antecedem, como: aumento da população nos grandes centros urbanos, distribuição de renda desigual e falta de políticas públicas direcionadas ao problema da violência urbana. O Fica Vivo! foi implantado em locais que atendem esses pré-requisitos e apresentam altas taxas de homicídios entre jovens de 12 a 24 anos. Existem 36 Unidades de Prevenção à Criminalidade (UPCs) instaladas no Estado, que são as bases locais desta política. As UPCs são órgãos ligados à Secretaria de Estado de Segurança Pública (SESP), por meio de uma Subsecretaria de Políticas de Prevenção Social à Criminalidade (SUPEC), e nelas são realizadas: análises da dinâmica criminal e violência no território, observação das necessidades dos jovens e da comunidade e atendimentos individuais dos jovens participantes caso necessário. Desde 2015 temos feito pesquisas etnográficas na UPC Rosaneves, um bairro considerado historicamente dos mais violentos de Ribeirão das Neves (cidade em que está sediado). O Programa se instalou na região em 2005 e em 2016 e 2017 houve a interrupção de suas atividades em decorrência de mudanças de governo e de processos de licitação. Essas interrupções evidenciaram conflitos territoriais criados pela ausência do programa e pela escassez de espaços públicos na região. Este artigo visa apresentar o bairro Rosaneves através do Fica Vivo!, buscando discutir em que medida este programa ressignifica e/ou reitera a ideia do cidadão precarizado, participando, consequentemente, dos processos de (re)construção das identidades sociais de seus participantes. Discutimos, assim, de que forma o movimento de territorialização dessa política marca a (re)produção de desigualdades sociais nas áreas inseridas, e como reverbera nas ações dos jovens participantes, a partir dos espaços de convivência proporcionados pelas oficinas, visando entender como “a violência” participa dessas dinâmicas.
Institucionalizadas e autônomas entre os processos de estado: reflexões sobre o campo feminista brasileiro contemporâneo
Autoria: Mariana Azevedo de Andrade Ferreira
Autoria: Esta proposta emerge no bojo de minha pesquisa de doutorado que tem o objetivo de investigar como se constituem práticas articulatórias entre diferentes gerações de feministas, especialmente entre grupos que tem sido caracterizados como institucionalizados e autônomos. Aqui, me interessa problematizar de maneira mais detida sobre as concepções de Estado que parecem informar o processo de diferenciação entre autônomas e institucionalizadas no campo feminista brasileiro contemporâneo. Desde o que se convencionou chamar de sua primeira onda, os movimentos feministas voltaram sua ação ao Estado. Seja na luta pelo sufrágio, abolicionista ou por direitos trabalhista. Entretanto, as relações de alguns grupos e organizações junto aos processos de estado têm sido agenciada no bojo das disputas internas do campo feminista e mobiliza o que tem se chamado de institucionalização. A institucionalização dos movimentos feministas diz respeito à fundação, sobretudo a partir do final da década de 1980, de diversas organizações não governamentais que a partir de então começaram a contar com financiamento de agências para a realização de ações voltadas à população e também aos processos de estado. O início da segunda década dos anos 2000 tem sido apontado como um novo marco para a história do feminismo brasileiro. Nesse contexto, a horizontalidade, a prática do faça você mesma e a negação de qualquer relação com os aparatos estatais e partidos políticos emergem como valores importantes neste novo campo autonomista. A alcunha institucionalizada/o, por sua vez, emerge como categoria acusatória por parte dos grupos e coletivos que se reivindicam autônomos. Não raramente, o termo institucionalizado é qualificado ou tido como sinônimo de cooptado e hierárquico. Com efeito, as importantes contribuições da antropologia contemporânea acerca dos processos de estado permitem a tessitura de outros olhares sobre sua relação com o campo feminista contemporâneo. Assim, acredito ser possível e profícuo, a partir dos ganhos analíticos de considerar o Estado para além de sua institucionalidade, mas como uma entidade complexa, um verdadeiro sistema de valores que atravessa toda a vida social, borrar a fronteira entre institucionalizadas e autônomas a partir da visibilzação das diversas formas como as mesmas se imiscuem aos processos de estado.
La gestión de la etnicidad: política de la identidad y asociaciones indígenas en el Vaupés colombiano
Autoria: Laura Sofia Fontal Gironza
Autoria:

Este trabajo surge del interés por los procesos que realizan las Asociaciones de Autoridades Tradicionales Indígenas (AATIs) en el Vaupés colombiano. La indagación se sitúa en la reinvención que las asociaciones hacen de la identidad étnica, que les permite desplegar acciones como medio de lucha política y de reinvención cultural frente al modelo hegemónico del Estado-nación colombiano. En el fenómeno del asociativismo es posible evidenciar cómo los pueblos indígenas establecen relaciones de negociación y confrontación con distintos actores, como asesores de ONG, funcionarios de gobierno y otros indígenas, para continuar escribiendo una historia de vitalidad social y cultural a pesar de las condiciones de marginalidad reproducidas y enquistadas durante siglos de dominación colonial.

Me avisa quando você chegar? Insegurança, Violência e Mobilizações em um campus universitário.
Autoria: Iris de Macedo Rosa, Nalayne Mendonça Pinto
Autoria: A pesquisa em andamento é um estudo sobre situações de conflitos e violências ocorridas nos últimos 5 anos no campus da UFRRJ. O objetivo é compreender as diferentes situações entendidas como conflituosas e violentas pela comunidade acadêmica e analisar as formas de organização de coletivos e mobilizações pelas redes sociais que procuram encaminhamento e soluções para as ocorrências de violências. Especificamente para esta apresentação serão analisadas algumas situações de violência contra mulher e as mobilizações sociais que foram produzidas através da articulação de alunas e coletivos feministas. Esta pesquisa entende a complexidade da violência enquanto objeto sócio antropológico, por ser este um fenômeno empírico que é sentido, representado e percebido a partir da interação social. Assim, a violência enquanto objeto de estudo possui caráter subjetivo que impacta a vida em sociedade uma vez que as representações sociais acerca da violência geram condutas. Transportada para o universo feminino, a subjetividade da violência ganha um caráter ainda mais particular, isto por que a violência contra a mulher é vivida, na maioria das vezes, individualmente. Nos últimos anos as denúncias de assédio moral e sexual, estupro e tentativa de estupro no interior e arredor do campus vieram à tona. As denúncias inicialmente estavam em grupos e páginas do Facebook, passaram às páginas de jornal e aos poucos caminham para os registros policiais. A atmosfera em transformação em torno de práticas antes silenciadas, fez com que os setores da comunidade acadêmica se posicionassem em torno do tema. Nesse sentido, serão apontadas algumas ocorrências mais emblemáticas que aconteceram e a repercussão social que produziram. Entre as iniciativas mais significativas está a página, criada por uma aluna, ‘Abusos Cotidianos’ que “surgiu com a necessidade de criação de um ambiente seguro e acolhedor para dar voz às vítim@s de abusos cotidianos dentro da UFRRJ”. A página é um lugar de desabafo e acolhimento onde vítimas escrevem a fim de encontrar o apoio e dar visibilidade às denúncias. A mais recente mobilização deu-se através do movimento feminista “Me avisa quando chegar UFRRJ”. O movimento surgiu em 2016 após uma aluna ser estuprada durante uma festa que ocorreu dentro do campus e inicialmente contou com 2.700 “ruralinas” em suas atividades. O nome veio do hábito cotidiano das alunas de pedirem umas as outras que deem notícias quando chegarem aos seus destinos por receio de que algo aconteça no caminho. Dessa forma, esse work busca entender o histórico dos conflitos na UFRRJ, como ele incide nas interações sociais entre os membros da comunidade acadêmica e ainda a atuação dos atores que estão envolvidos nos seus processos de administração e contestação.
Mídia, Segurança Pública e a Chacina do Cabula
Autoria: Taiane Almeida Santos, HERBERT TOLEDO MARTINS
Autoria: Apresenta-se uma análise do Caso conhecido como “Chacina do Cabula” por meio da cobertura dos dois jornais impressos de maior circulação no estado da Bahia. O problema de pesquisa orientou-se pelo questionamento de qual modelo de segurança pública subjaz aos textos informativos noticiosos veiculados pelos jornais em tela, o tratamento midiático com relação à política de segurança pública vigente à época da Chacina, e quais foram os conteúdos manifestos que permitiram compreender a posição do governo do Estado em relação ao evento. Metodologicamente, o work seguiu técnicas da Análise de Conteúdo Bardin (2010), por meio da qual foi possível inferir e interpretar as notícias veiculadas nos periódicos. A partir da investigação, compreendemos que vários são os desafios colocados e uma multiplicidade de mudanças urgentes. Dessa maneira, a partir de um ponto de vista teórico ancorado em autores principais pretendeu-se demonstrar empiricamente que a cobertura de ambos os jornais em tela sobre a Chacina do Cabula foi pautada no senso comum e com isso, foram favorecidas as “fontes oficiais” (autoridades do governo do Estado) e a sua política de segurança representada pelo Programa Pacto Pela Vida, não questionada em momento algum, sobretudo, ao silenciar sobre o instituto dos autos de resistência. Como resultados temos que a Política de Segurança do Estado da Bahia não se apresenta como inovadora, pois antigas práticas permanecem vigentes, reproduzindo traços de Estado Penal, baseada em uma lógica racista de ocupação e remoção de moradores. Finalmente, a Chacina do Cabula é, do nosso ponto de vista, um exemplo inequívoco do insucesso do PPV-BA, e da demonstração de que se trata de uma política de segurança pública equivocada, pois, como tentamos demonstrar, não rompe com o paradigma da guerra às drogas e, por isso, torna-se, enquanto política de Estado, refém da truculência de uma polícia formada, preparada e estimulada a combater e exterminar o inimigo, o pequeno traficante da esquina, dos morros e das periferias das grandes cidades.
Mobilização social de indígenas no contexto de reação à tentativa de controle estatal do território no baixo Tapajós, PA
Autoria: Maurício Rafael Cardoso Modesto
Autoria: A relação do Estado para com as populações indígenas da região do baixo Tapajós (PA) perpassa por situações de bastante conturbação e conflitos. Considerando a intervenção estatal através das constantes medidas de reordenação dos espaços destinados aos indígenas, temos uma realidade que se apresenta a partir de várias tentativas de controle do território, e aqui reside o caráter de importância dessa proposta de work, pois é latente a necessidade de conhecer a fundo todas as formas de organização e resistência desenvolvidas por estas populações em confronto com as práticas de intervenção estatal nos processos de territorialização local.Desse modo, percebe-se também a necessidade de se compreenderem as práticas e processos de tentativa de controle adotados pelo aparato estatal, na tentativa de se interpretarem os reais interesses que mobilizam o Estado em seus padrões de regulação de territórios.
Movimentos e lutas contra o governo: a questão fundiária e ambiental na BR-163 paraense
Autoria: Renata Barbosa Lacerda
Autoria: A partir de narrativas sobre histórias de vida, a história regional e os conflitos em torno das políticas fundiárias e ambientais implantadas na área da BR-163 do Sudoeste Paraense, o presente work busca discutir a teoria nativa sobre mobilizações sociais com base nas categorias movimento e luta, as quais revelam confluências entre as formas de pensarem as mobilidades social, econômica e geográfica e as mobilizações sociais. As narrativas analisadas foram obtidas em entrevistas e conversas informais feitas em works de campo realizados em 2013 e 2017 em Novo Progresso, Itaituba, Altamira e Santarém, bem como na imprensa e em três livros sobre a história local escritos por progressenses. Ao buscarem resolver os problemas causados a seu ver pelo governo ao longo do tempo, grandes e pequenos produtores rurais, garimpeiros, madeireiros, trabalhadores rurais empreenderam ações coletivas torno de causas construídas como comuns, produzindo identidades e coletividades em variadas escalas e recortes. Essas ações e causas, associadas respectivamente à ideia de fazer movimentos em torno de lutas, são justificadas por denúncias ao governo e uma experiência compartilhada de injustiça no sentido de desrespeito a direitos legais e morais. Se em parte essa crítica se dá quanto à sua ausência histórica na oferta de serviços públicos – conquistados segundo eles pelo seu próprio work e luta –, em parte se dá pela sua ação considerada repressiva a partir do que é identificado como “mudança das regras do jogo” que teria gerado a crise que paralisou a produção econômica e o desenvolvimento das cidades. Essa mudança dos termos pelos quais esses sujeitos concebiam a mediação estatal na apropriação privada das terras públicas, da floresta e dos minérios na região é atribuída a medidas decorrentes do Plano BR-163 Sustentável, cujo objetivo era mitigar os impactos sociais e ambientais da pavimentação da rodovia federal BR-163, com foco no combate ao desmatamento e à grilagem. A perspectiva etnográfica mostra que estão em jogo disputas pela imposição de visões de mundo com base em arranjos sociais variáveis entre agentes heterogêneos. Com isso, defende-se que os conflitos fundiário e ambiental não podem ser compreendidos por chaves analíticas restritas aos interesses econômicos, à luta de classes e a diferenças de lógicas de apropriação de terra, devendo-se levar em conta as representações sociais e as redes de relações que atravessam as diferentes identidades construídas.
Novos meios de mobilização social na Amazônia
Autoria: Manuela Souza Siqueira Cordeiro
Autoria: A proposta deste artigo é verificar como são acionados atualmente outros canais de mobilização social na Amazônia. Propõe-se como caso de estudo a ser analisado a disseminação dos conflitos na terra indígena Uru-Eu-Wau-Wau, localizada na parte sudeste do estado de Rondônia, no que tange à sobreposição de terras, seja com o antigo Projeto de Assentamento Dirigido (PAD) Burareiro, bem como atualmente as invasões de grileiros e proprietários do agronegócio. A disputa pela terra é datada da implantação do PAD Burareiro, em 1974, uma vez que 122 famílias devidamente assentadas pelo INCRA foram dispostas na mesma área já homologada enquanto parte da Terra Indígena, se acirra com as investidas do agronegócio da pecuária de corte, dominado pela elite política da região. Em maio de 2018, as lideranças indígenas da TI Uru-Eu-Wau-Wau propuseram ativamente uma denúncia, utilizando as redes sociais, demonstrando em quase tempo real o ateamento de fogo na comunidade indígena pelos grileiros. Busca-se entender se está em jogo a emergência de uma nova forma de mobilização social (Cf. Sigaud, Rosa e Macedo, 2008). Em termos de procedimentos metodológicos, serão utilizados depoimentos dos líderes indígenas da área, além da associação Kanindé, responsável pela elaboração do laudo etnoambiental da referida terra indígena, a partir de visitas a terra indígena e entrevistas com os responsáveis pela associação.
O autorreconhecimento e os conflitos étnicos na comunidade quilombola Patos do Ituqui (Santarém, PA)
Autoria: Marcos Antonio Silva dos Santos, Luciana Railza Cunha Alves
Autoria: A comunidade quilombola Patos do Ituqui, em Santarém, Pará, autorreconhecida como “remanescente” desde 2012 e certificada pela Fundação Palmares em 2013, assim como outros grupos étnicos, organizam-se em torno da identidade como forma de resistência e de manutenção de suas formas de ser e estar no mundo. O avanço das fazendas de soja e gado sobre seu território tradicionalmente ocupado é um dos principais motivos de reivindicação do direito à titulação de suas terras junto ao Estado. Neste sentido, como se deu o processo de reconhecimento? Que investidas sobre a comunidade foram e são feitas como forma de coagir e enfraquecer essa afirmação identitária? Essas são algumas questões chave para a discussão apresentada neste artigo desenvolvido com base na metodologia de pesquisa participante. Desta forma, percebeu-se a violência simbólica através de difamação pública na mídia e ameaças de uso de força policial como uma das principais estratégias usadas contra os quilombolas de Patos do Ituqui pelos interessados na concentração de terra para um modelo de uso e manejo baseada na exploração compulsória dos recursos naturais, ao contrário das estratégias de sobrevivência das/dos quilombolas que constroem de forma tradicional e coletiva o manejo da terra, rios e lagos.
Prolongamentos de um desastre: do deslocamento compulsório ao reassentamento
Autoria: Luisa Machado de Siqueira
Autoria: Com o rompimento da barragem de rejeitos de mineração de Fundão, operada pela Samarco Mineração S.A., em 5 de novembro de 2015, são deslocados compulsoriamente para a cidade de Mariana, Minas Gerais, os sujeitos que tiveram suas comunidades devastadas dentro do município. O processo de busca por reconhecimento de seus direitos enquanto atingidos pelo desastre está inscrito em um contexto histórico da região, que diz respeito à importância da mineração na constituição da vida local. Mariana, cidade que nasce no século XVII da relação com a mineração de ouro, tem na passagem para a mineração de ferro no século XX a continuação de um histórico de dependência econômica da atividade extrativista. Com o embargo das atividades da mineradora e a chegada dos atingidos da região, há uma transformação abrupta da situação social na cidade. A presença de movimentos que pedem pelo retorno das operações da empresa marca um desses pontos de acirramento das tensões criadas pelos efeitos do desastre. A cidade não foi atingida pela lama de rejeitos, mas convive com efeitos diretos do desastre, assim, para entender como vem sendo, nos últimos quase 3 anos, a vida dos sujeitos deslocados temporariamente para a cidade e em busca de reassentamento, será preciso levar em conta os rearranjos e motivações dos atores envolvidos no processo de reparação. O que leva à percepção do desastre da Samarco não apenas como o evento do rompimento, mas como um processo duradouro, que começa no rompimento e se estende durante todo processo de busca por reparação, ainda em andamento, considerando os sofrimentos e violações de direitos que são iniciados ou aprofundados na relação com as instituições locais e seus agentes. Se apresenta como necessidade aos atingidos a adaptação a um léxico complexo e hermético que diz respeito à ordem “técnica” e jurídica, que é constantemente acionada para deslegitimar demandas desses sujeitos que tiveram suas vidas invadidas pela incerteza. Atravessar alguns momentos nas transformações das relações sociais em Mariana como efeito do desastre permitirá pensar como se organizam os atingidos para a demanda de seus direitos frente à empresa, ao Estado e a seus novos vizinhos, e que tipo de disputas, acusações ou estigmatizações marcam esse processo, além de seus efeitos na organização para reivindicação de reconhecimento de direitos dos atingidos.
Relatório Figueiredo: tutela e classificação contra povos indígenas
Autoria: Gabriela Galvão Braga Furtado
Autoria: O presente work é resultado de uma pesquisa que teve como fio condutor o Relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito, que registra denúncias de massacres contra indígenas, coordenado pelo procurador Jáder Figueiredo, em julho de 1967, para apurar as irregularidades no Serviço de Proteção aos Índios (SPI) ocorridos entre 1946 a 1988, este documento é conhecido como Relatório Figueiredo (RF). É importante assinalar a descoberta do Relatório pela Comissão Nacional da Verdade (CNV), que segundo a comissão mais de 8 mil indígenas foram vítimas de violência. À vista disso, foi possível compreender como os povos indígenas foram submetidos ao estado pelo órgão SPI, destacando a tutela e imagens pré-concebidas referidas a comunidades indígenas por meio da utilização de termos ou categorias classificatórias, como; selvagens. E estudar essa violação de direitos descrita no Relatório Figueiredo é entender o resultado do processo histórico de inferiorizarão dos povos indígenas, sendo vistos como empecilhos para o progresso do estado brasileiro, que tinha a intenção de proteger, contudo acabaram por violar os seus direitos. Essa análise antropológica e histórica ajuda a entender os conflitos contemporâneos, nos quais as questões territoriais, agronegócio e violência institucional, são os principais focos de violação dos direitos dos indígenas.
Tecendo cuidado a várias mãos: notas sobre a construção de um diálogo entre saberes tradicionais e políticas de saúde na região do baixo Tapajós
Autoria: Luana da Silva Cardoso, Luana da Silva Cardoso (UFOPA) Pedro de Lemos MacDowell (SESAI) Rodrigo Magalhães de Oliveira (MPF)
Autoria: Um dos desdobramentos do processo de etnogênese iniciado há quase 30 anos na região do rio Arapiuns e do baixo rio Tapajós é a reivindicação do direito de acesso ao modelo diferenciado de saúde indígena preconizado na legislação específica do SUS. Por meio de uma decisão judicial no âmbito de uma Ação Civil Pública impetrada pelo MPF em 2015, a população que pode chegar a 8000 indígenas de 13 etnias distintas conquistou o direito à atenção de saúde diferenciada, ganhando o reconhecimento pela SESAI, do Ministério da Saúde, que assumiu então sua responsabilidade sanitária na região. Após um período de cadastramento da população e de negociação entre os diversos atores envolvidos no processo, finalmente uma equipe da SESAI iniciou a realização de ações de saúde nessas aldeias no mês de julho de 2017. Desde as conversas iniciais para a realização destas ações, contudo, as lideranças indígenas à frente do processo, representadas principalmente pelo Conselho Indígena do Tapajós e Arapiuns (CITA), reivindicaram uma entrada cuidadosa dessas equipes, com atuação construída de forma participativa junto a cada comunidade, garantindo o respeito às práticas e conhecimentos tradicionais de saúde e o protagonismo dos cuidadores atuantes na região. Os povos do baixo Tapajós e Arapiuns querem a presença das políticas públicas de saúde em suas aldeias, mas não querem com isso a imposição do modelo biomédico em detrimento de suas formas próprias e tradicionais de cuidado, bem como suas práticas alimentares, como ocorre frequentemente. Neste work, uma liderança do CITA, um antropólogo da SESAI e um assessor do MPF, representando os três principais grupos agentes no processo, buscam refletir conjuntamente sobre os desafios dessa construção.
Testemunhas do conflito: documentos oficias que demostram os processos de violência direcionado aos povos indígenas no brasil
Autoria: Vinícius da Silva Machado
Autoria: O resumo apresentado tem por objeto a relação entre Justiça, Povos Indígenas e Conflitos e por temática as possibilidades de observar, em documentos oficias de produção estatal, as agencias desenvolvidas pelos povos indígenas contra as ações de dominação colonialistas na construção de suas estratégias de enfrentamento frente ao Estado Brasileiro. Utilizamos para isso o Relatório Figueiredo. Um documento que durante anos ficou ocultado dentro dos porões da ditatura civil militar brasileira, existindo algumas hipóteses afirmando a sua destruição por um incêndio no ministério da agricultura, em junho de 1967, e seu conteúdo se transformado em pó de esquecimento. Porém, ele foi redescoberto em novembro de 2012 pelo pesquisador Marcelo Zelic no Museu do Índio, no Rio de Janeiro, emergindo para a luz da verdade como uma ferramenta histórica importante a qual apresenta uma quantidade fantástica de relatos que permitem criar novas possibilidades de análises sobre a atuação do SPI e do indigenismo brasileiro contemporâneos. O Relatório da Comissão Nacional da Verdade é outro documento que utilizamos. Ele foi produzido por uma comissão composta de sete membros nomeados pela presidente do Brasil Dilma Rousseff, auxiliados por assessores, consultores e pesquisadores. A lei que a instituiu (Lei nº 12.528/2011) foi sancionada em 18 de novembro de 2011 e a comissão foi instalada oficialmente em 16 de maio de 2012 e seu relatório foi divulgado em 10 de dezembro de 2014. Dessa maneira para entender as possibilidades de interrelação do Estado Brasileiro com os povos indígenas, tendo como base de contato o conflito, de forma hegemônica, será necessário compreender esses documentos como relatos de experiencias dos agentes representantes dos interesses nacionais. Relatos de testemunhas da barbárie realizada pelo colonialismo interno. O resumo apresenta reflexões preliminares da produção da dissertação de mestrado do autor e se relaciona com o GT através da elaboração sobre as violências cometidas pelo Estado contra os povos indígenas.
“Arte e Cultura por Toda Parte”: refletindo sobre intervenção militar federal e cultural na cidade”
Autoria: Ludmila Maria Moreira Lima
Autoria:

No início de 2018, anunciava-se, no Rio de Janeiro, o fim do programa das Unidades de Polícia Pacificadora-UP’s, assim como eram veiculadas, na mídia, reportagens sobre aumento de todo tipo de criminalidade. A narrativa midiática da degradação da segurança pública na cidade aumentou no período carnaval e, sob alegações de descontrole local, em 16 de fevereiro de 2018, foi decretada Intervenção Federal na Segurança Pública, com a entrega do controle de uma instância civil de poder aos militares, para “o restabelecimento da ordem e impedimento do avanço do crime organizado”. Esta Intervenção desencadeou conflitos e mobilização por parte da sociedade civil, por meio da criação de fóruns e espaços de discussão para a proposição de articulações destinadas à organização da resistência contra as arbitrariedades impostas pelo poder público, e no sentido de propor novas formas de enfrentar as complexidades e narrativas construídas em torno das formas e “gestão da violência” no Rio de Janeiro. Em março de 2018, surge a rede e movimento cultural IntervenSomos, criado por trabalhadores da cultura, da arte e da educação, unidos não só para reagir à intervenção militar, como também para pensar e planejar coletivamente outras formas de intervenção em espaços públicos e escolas da cidade por meio de ações culturais, artísticas e educacionais, cuja agenda permanecerá em vigor, em princípio, durante todo o período em que persistir a intervenção militar no Estado. Esta reflexão se insere num projeto de pesquisa cujo foco são “coletivos e ativismo culturais na cidade”, pensados a partir de sua potencialidade política para induzir críticas, criar resistências e enfrentamentos. Diante da pluralidade de coletivos e movimentos que atuam nos espaços-públicos do Rio de Janeiro, como ponto de partida, elegemos como sujeitos de nossa interlocução e análise, os integrantes da rede e movimento cultural “IntervenSomos – Arte, Cultura e Educação para reinventar a cidade”. Trata-se de um estudo de caso, envolvendo pesquisa teórica, documental, virtual e work de campo com vistas à produção final de relato, textos, ensaios e produção de um curta-metragem referente ao que foi investigado.