Cinque Terre
GT 003. A luta pelo espaço nos centros urbanos contemporâneos
Urpi Montoya Uriarte (Universidade Federal da Bahia) - Coordenador/a, Cornelia Eckert (UFRGS) - (Coordenador/a), Cristina Patriota de Moura (Universiade de Brasília) - Debatedor/a, Luísa Maria Silva Dantas (PPGAS/UFRGS) - Debatedor/a, Ana Luiza Carvalho da Rocha (Universidade Feevale/RS) - Debatedor/a
Nos centros urbanos convivem uma grande quantidade de espaços vazios desocupados e pessoas morando nas ruas, prédios abandonados e cortiços superlotados, edifícios restaurados e ruínas urbanas, imóveis ocupados por refugiados de todos os tipos, territórios de legalidades e ilegalidades. Neste espaço de múltiplas contradições e conflitos se livram, na atualidade, de forma aberta ou difusa, uma luta violenta e desigual pelo espaço, protagonizada por racionalidades opostas e lógicas complexas, formas distintas de entender a ordem, de habitar e de circular, de rememorar, de usar ou contra-usar. Projetos de reabilitação, revitalização, gentrificação, empreendedorismo e ordenamento urbano intervêm no espaço público usado por milhares de pessoas para sobreviver e nos prédios habitados por aqueles outros tantos que mal conseguem sobreviver. O capital destrói, constrói ou reconstrói ali onde lhe é conveniente enquanto os habitantes e usuários do centro se refugiam em espaços opacos, nas dobras dos espaços abstratos, construindo e reconstruindo suas formas de habitar os lugares centrais. O objetivo deste grupo de trabalho é congregar os diversos tipos de abordagens etnográficas que revelem e discutam a complexidade e os antagonismos que se defrontam nos centros urbanos contemporâneos, a “guerra de lugares” que se processa nele e as formas de entender o que é o centro e como habitá-lo.
Resumos submetidos
"Os filhos da Vila resistem": mobilização, organização e confronto num movimento social urbano em Fortaleza, CE.
Autoria: Aline Maria Matos Rocha, Linda Maria de Pontes Gondim
Autoria: Esta pesquisa, em andamento, consiste num work de tese que tem como recorte empírico o movimento Resistência Vila Vicentina. Objeto de filantropia, a Vila Vicentina da Estância é um conjunto de 45 casas e uma capela, construídas no final da década de 1930, para abrigar idosos que migraram para Fortaleza por conta da estiagem. Localizado no bairro Dionísio Torres, o terreno ocupado pela Vila vem sendo objeto de disputa do mercado imobiliário, em virtude de sua valorização. Organizado desde 2016, um grupo de moradores do local vem se mobilizando com o objetivo de contestar a venda do terreno e a negociação de algumas casas, que foram demolidas no mesmo ano, numa ação de reintegração de posse. Contribuindo para legitimar a luta, está o mapeamento da área como Zona Especial de Interesse Social (Zeis) no último Plano Diretor de Fortaleza; além do tombamento provisório do local, por seu valor histórico, arquitetônico e urbanístico. Por meio de um estudo de natureza qualitativa, mediante permanência prolongada e intermitente no campo, venho realizando observações e incursões etnográficas, entrevistas e análise de documentos, além de estudo da literatura que envolve a ação coletiva na teoria social. Desse modo, analisar estratégias de mobilização e confronto utilizadas pelos movimentos sociais urbanos é o principal objetivo do work. Dedico-me a compreender práticas de organização da ação coletiva atuais, envolvendo conflitos relacionados ao direito à cidade, os quais permeiam a luta pela moradia e permanência no espaço urbano. Fazendo parte dos objetivos, estão a consideração dos diferentes recursos acionados pelo movimento e sua efetividade para pressionar opositores, o que implica na identificação do papel que as tecnologias de informação e comunicação desempenham nesse processo. Fator relevante é que, atualmente, a mobilização em torno de problemas sociais tem encontrado na Internet um espaço de expressão e visibilidade importante, mas não exclusivo, destacando o caráter híbrido de fenômenos dessa natureza. Essa condição conduz a posturas que se “desdobram”, de maneira simultânea, na observação e inserção em espaços on e offline - o que tem exigido uma reflexão constante sobre meu papel e conduta em campo. Por sua vez, o percurso metodológico envolve disposições e triangulações que consideram contexto virtual e presencial, caracterizando, por meio desse percurso, o estudo de objetos multissituados. Os achados parciais da pesquisa trazem a descrição do caso, destacando os repertórios de confronto que têm se mostrado efetivos na disputa. Além disso, soma-se ao conjunto das reflexões, aspectos vinculados à memória, ao afeto e ao sentimento de pertença dos moradores-resistentes para com o lugar que ocupam há décadas.
#CentroVivo: Uma Nova Perspectiva de Ocupação do Centro de Belo Horizonte - MG.
Autoria: Beatriz Ribeiro Machado
Autoria: Este work aponta para as desigualdades de acesso a moradia na cidade de Belo Horizonte, em especial na região central da metrópole, onde parte da população que vive em regiões periféricas da cidade não é incluída em suas agendas políticas e de lazer. A construção de Belo Horizonte – final do séc. XIX início do séc. XX - nos aponta para um processo histórico de exclusão das populações trabalhadoras, que desde os primeiros anos foi negligenciada para além das bordas da avenida Contorno. Neste sentido, o caso da Ocupação Vicentão evidencia um movimento contemporâneo que busca a partir da #centrovivo trazer uma nova perspectiva de ocupação, moradia e work ao centro da cidade, a partir da luta por moradia e do direito do trabalhador ambulante. A história da construção da cidade de Belo Horizonte se mistura à história desses novos moradores e suas práticas políticas de luta pelo direito à cidade. A cidade neoliberal passa a ser questionada pelos agentes ocupantes dos espaços que outrora eram reservados à branquitude da cidade tradicional.
A cidade dos meus amores: os problemas públicos em torno da “gestão urbana” do Centro Histórico da cidade de Vitória – ES e seus públicos
Autoria: Manuela Vieira Blanc, Liliane Moreira Ramos Amanda Alvarenga Néspoli
Autoria: Inserido em uma trajetória de pesquisa que assume as formas de apropriação dos espaços públicos urbanos como contextos de circulação e coexistência, este artigo analisa as disputas em torno da gestão desses espaços do Centro Histórico da cidade de Vitória, ES. Ao longo de cinco anos de observação sistemática de práticas transcorridas nessa mancha de sociabilidade e lazer, identificou-se uma profusão de vozes que disputam um imaginário de cidade e um modo de vida urbana espacializado. Assim vem sendo mapeadas modalidades de se pensar e agir sobre a cidade, mobilizadas por diferentes públicos em diferentes situações. Evidenciou-se assim um projeto de requalificação da região que remete à sua autenticidade como instrumento de valorização simbólica do local, inspirando iniciativas de intervenção sobre equipamentos culturais, vias de circulação e mesmo iniciativas de controle dos usos dos seus espaços. As estratégias articuladas por novos e antigos investidores da região, diante dos efeitos desses processos de disputa pelo espaço, se apropriaram ao longo do tempo da lógica discursiva, dos modos de fazer e até mesmo da estética que emerge nesse processo que, pretendendo revitalizar, rivaliza com práticas, modos e usos. Deste modo, vem sendo identificados processos de constituição e dissolução de diferentes públicos em torno de problemas, disputando a definição dos mesmos, bem como das suas soluções, estas aqui percebidas como modos de gerir o espaço. Em função dos nossos objetivos, serão remontadas neste work as lógicas discursivas acionadas na disputa pela presidência da Associação de Moradores local (AMACENTRO), ocorrida em agosto de 2018, refletindo sobre os referenciais de bairro acionados durante o processo de formação das chapas e realização da campanha, bem como os problemas apontados e os modos como se definem. Foi possível perceber como dois grupos foram compostos por atores individuais ou coletivos atuantes no bairro e sobre o bairro durante o período de realização das eleições. Esses públicos, finalmente, são marcados por perfis de atuação, lógicas de significação e formas de intervenção que refletem moralidades e disputam modalidades de ocupação deste espaço público e seus sentidos. Compreender como dialogam entre si é, finalmente, também um modo de compreender uma lógica de gestão da cidade emergente e que, estimulada por parcerias público/privadas, parece estar, mais recentemente, cooptando parte desses mesmos atores individuais ou coletivos segundo uma lógica neoliberal que se assenta em um esvaziamento do papel do estado e uma transferência de responsabilidade para os cidadãos/citadinos sob os signos do empreendedorismo, da criatividade e da inovação.
A CIDADE E A PRAÇA Interações, práticas e atores sociais da Praça da Bíblia - ACD
Autoria: Jesus Marmanillo Pereira, Antonia Eliane Lobo Carneiro
Autoria: A presente pesquisa trata da análise dos principais atores que compõe a dinâmica social e espacial da Praça da Bíblia na cidade de Açailândia-MA, especificamente os usos sociais praticados naquele espaço localizado entre a Rodovia BR 010 e o bairro Jacu. Partimos da hipótese de que é possível compreender a história e alguns aspectos da cidade por meio do estudo sobre as sociabilidades e as formas de uso do referido logradouro público. Neste sentido, nos valemos de embasamentos teóricos fundamentados na Etnografia de Rua (ECKERT e ROCHA, 2001), nos estudos sobre praças empreendidos por Low (2005) e no conceito de centralidade (MCKENZIE, 1948 apud PEREIRA, 2016, p.2). Tais referenciais foram operacionalizados por meio do mapeamento dos principais atores sociais que ocupam a praça, bem como dos usos e práticas que eles desenvolviam naquele cenário. Assim, buscamos entender os comportamentos, sentidos e situações que possibilitam a existência do agrupamento de pessoas na Praça da Bíblia. Em termos metodológicos, realizamos uma pesquisa de campo de cinco meses, situados entre os anos de 2016 e 2018. Por meio desta foi possível estabelecer diálogos com os principais atores do lugar, realizar observações diretas e obter outras fontes que nos possibilitaram estabelecer algumas relações entre às interações e às práticas sociais desenvolvidas na praça e o próprio contexto da cidade de Açailandia-MA.
As ocupações urbanas de Belo Horizonte em suas práticas do fazer-cidade pelas margens: ocupando territórios e (re)construindo dispositivos discursivos.
Autoria: Mayara Ferreira Mattos
Autoria: Frente à incapacidade e ao desinteresse de determinados aparatos de estado em promover uma política urbana preocupada em garantir o direito à moradia para todos(as) que nas, e das, cidades vivem, as ocupações urbanas emergem no contexto urbano como lugares de tencionamento e possibilidades outras do fazer-cidade. Inscritas nos recantos da cidade formal, como reflexo da espoliação urbana e das formas de acumulação de riquezas na produção dos espaços, sua presença reivindica um espaço de sobrevivência que responde à burocracia e à ordem excludente estatal, e reclama por direitos. Como reflexão quanto à gestão diferencial dos ilegalismos, as ocupações urbanas emergem como movimento de luta que desloca a discussão da tautológica dicotomia operante entre o legal e o ilegal, formal e informal. O objetivo então, é colocar no centro do debate o modo como as leis operam, não para controlar ou suprimir os ilegalismos, mas para diferenciá-los internamente (TELLES, 2010). Para tal empreendimento, é importante a compreensão das relações operantes entre a política popular (atividade organizada por grupos subalternizados), e as funções e o exercício dos modernos/coloniais sistemas governamentais, os quais concentram suas práticas em esquemas classificatórios orientados pela noção de população, que conduz a administração de políticas desenvolvimentistas em prol da relação/confluência estado-capital (CHATTERJEE, 2008). Na medida em que transgridem a linha tênue entre a legalidade/ilegalidade, formalidade/informalidade, na luta por moradia e permanência, as ocupações incidem sob a ordem estatal ocupando propriedades inutilizadas, que muitas vezes pertencem ao interesse privado ou mesmo ao próprio estado. Desde o abastecimento de água e eletricidade até mesmo a organização política dentro desses locais, escapam ao controle tutelar e econômico do estado. Contudo, muito além de estarem descoladas das agências estatais e da própria cidade formal numa relação centro-periferia em que a periferia se encontra totalmente aquém e além desse centro, as ocupações atravessam as instâncias formais. Pensar as margens como agentes capazes de atravessar e também serem atravessadas pela trama das práticas estatais rompe com a visão ocidental colonizadora do estado como forma administrativa racional de organização (DAS & POOLE, 2008). Apesar do estado e das margens estarem em uma relação de poder muito desigual, é importante entender que ambos se formam através das experiências locais e não apenas na ação política organizada.
Cidade Contínua|Ocupada: Espaço Público, Intervenções Urbanas e Lógica Transcultural Digital em Territórios Descontínuos
Autoria: Dinah Tereza Papi de Guimaraens
Autoria: Redes virtuais criam um universo digital real e produzem uma imagem estético-cultural no Rio de Janeiro ocupado, em 2017-2018, pelas forças militares da Garantia da Lei e da Ordem (GLO). O espaço participativo urbano, - definido pela atuação de uma nova classe média articulada por redes virtuais e pelo conhecimento conjunto de acadêmicos, artistas, hackers e ativistas -, estabelece uma linguagem de cidadania criada pelo multifacetado mundo dos bens comuns nos movimentos participativos de rua. Ocorre o estabelecimento de uma cadeia produtiva de produtos e eventos que indicam uma nova economia criativa da cultura carioca na Cidade Contínua|Ocupada. Busca esta investigação identificar visualmente, através de uma cartografia sensível (CARERI, 2013) com uma documentação gráfico-fotográfica, bem como analisar criticamente as marcas urbanas impressas no espaço público participativo brasileiro. Dentro de uma lógica transcultural (GUIMARAENS, 2016) relacionada às transformações ocorridas na junção de culturas distintas, se estende o alcance do saber acadêmico em arquitetura e urbanismo, ampliando a discussão para o campo da da antropologia, da filosofia e das tecnologias digitais, de forma a encontrar soluções viáveis para o impasse de megacidades brasileiras e latino-americanas quanto à ocupação do espaço público. A qualidade de vida urbana carioca se encontra ameaçada pela onda de violência exacerbada ora vigente em favelas da zona sul e em comunidades de subúrbios e da zona oeste. A falência de um modelo neoliberal de poder público que entende a cultura somente como “commoditização” (BRANDT, 2003, p. 3) parece ser um dos responsáveis por tal violência, indicando uma dimensão de dominação e manipulação que se expressa na cidade contemporânea. Será que a superação de desigualdades estruturais da sociedade do capitalismo tardio (JAMESON, 2004) poderia, em contrapartida, conduzir à adoção da perspectiva dos desprivilegiados que orienta os rumos de um urbanismo comprometido com ideais de justiça social e cidadania participativa? Ou será que uma Cidade Desigual se afirma cada vez mais, em meio à própria violência tantas vezes recrudescida pela tentativa frustrada do poder público em contê-la através de forças policiais e militares? Desde junho de 2013, eclodiram forças coletivas divulgadas pelas redes sociais indicando que, como sugeriu Lévy (1996), o espaço virtual é um espaço real. Algumas das questões fundamentais da pesquisa são: Como as redes virtuais criam um mundo digital real e produzem uma nova imagem política e estética no Brasil urbano contemporâneo? Como esta nova cidade participativa define um mercado de bens culturais virtuais entendido como fator primordial de desenvolvimento político-social?
Da Várzea à província oceânica: notas etnográficas sobre a revisão do Plano Diretor do Recife
Autoria: Fabiano Lucena de Araujo
Autoria: O presente work visa apresentar alguns elementos reflexivos sobre o work de campo realizado pelo autor e que constitui um momento de sua pesquisa, mediante o qual se dedica a investigar o processo de revisão do Plano Diretor da cidade do Recife, a partir da ótica de sujeitos da classe média e de intelectuais, observando desde reuniões de moradores de bairros às palestras públicas oferecidas por profissionais da área de urbanismo. O Plano Diretor Municipal é um dispositivo legal previsto pela Constituição de 1988 e obrigatório para municípios com população a partir de vinte mil habitantes, que regulamenta um conjunto de leis que definem instrumentos de planejamento urbano, onde delimitam, por exemplo, a construção de edificações, a preservação do patrimônio artístico e histórico e do meio ambiente e as garantias de moradia de comunidades desfavorecidas. A observação em processo parte da discussão do Plano Diretor pelos moradores da Várzea, maior bairro da cidade, localizado na região oeste e detentor de importantes órgãos públicos relacionados ao setor educacional, como a Universidade Federal de Pernambuco e a Secretaria Estadual de Educação. Esta localidade além de possuir uma visibilidade institucional considerável, ostenta uma situação heterogênea de classes: de moradores de classe média como estudantes e docentes da UFPE e entorno às comunidades empobrecidas e salvaguardadas por lei, as ZEIS (Zonas Especiais de Interesse Social), Rosa Selvagem, Vila Arraes, Brasilit, Sítio Wanderley e Campo do Banco. Tendo-se em vista, a disparidade de classes que ocupam o bairro da Várzea, na discussão do Plano do Diretor na localidade foi constatada uma diversidade de interesses entre docentes universitários, líderes comunitários das Zeis (Vila Arraes) e de uma ocupação realizada em torno da principal avenida que corta o bairro (Caxangá) pelo Movimento Urbano dos Trabalhadores Sem Teto (MUST), chamada Ocupação Contra o Golpe. Exposta a conjuntura empírica e inicial de análise, algumas questões conceituais foram levantadas pelo autor e se inserem no contexto maior da pesquisa de doutoramento, em que se investiga a construção da relação atual da classe intelectual recifense com o espaço urbano da cidade, a partir da reivindicação afetiva da modernidade, tendo como problemática verificar em que medida uma tradição de práticas e discursos se sustenta como continuidade nos ideários regionalista, do manguebeat e da contemporaneidade pós ocupações. O objeto de investigação é a análise das imagens produzidas e os textos desta classe intelectual com enfoque no hoje e no como se constrói a relação entre identidade, self e patrimônio, embasado em autores como Henri Lefebvre, Françoise Choay, Rogério Proença Leite, Denis Bernardes, Michel Agier e Guilherme Magnani.
Etnografando Audiências Públicas: o caso da Operação Urbana Consorciada Jardim Botânico
Autoria: Pedro Henrique Baima Paiva
Autoria: O antropólogo Claude Lévi-Strauss visitou a cidade de Goiânia em 1937, quatro anos após o lançamento da pedra fundamental pelo então interventor federal Pedro Ludovico Teixeira, e sua impressão foi que “ali nos sentíamos como numa estação de trem ou num hospital, sempre passageiros, e nunca residentes” (LÉVI-STRAUSS 1996, p. 132). A cidade planejada e modernista que nasceu no centro oeste do país, durante esse tempo foi escolhida por pessoas vindas de vários Estados para trabalhar e viver. Contudo, para algumas dessas pessoas que há mais de 60 anos lutam pela escritura de suas casas, essa sensação de “passageiro”, vez ou outra ainda volta à lembrança. Este é o caso dos moradores da Ocupação do Jardim Botânico (OJB), que mais uma vez enfrentam a ameaça de despejo após o anúncio de projetos urbanísticos para a região. Construída às margens do Botafogo, córrego que historicamente acolheu muitas famílias vindas para a construção da cidade planejada, a OJB trava uma disputa com a prefeitura em busca da regularização fundiária das casas no mesmo momento em que o setor imobiliário lança seu olhar para o potencial de valorização da área e pressiona o poder público por intervenções. É nesse contexto que a cidade de Goiânia, planejada e construída na década de 1930 como símbolo da ruptura do tradicional em busca da modernidade, se torna um ótimo caso para análise. A capital do Estado de Goiás tem experimentado o que Harvey (2014) chamou de desenvolvimento incoerente e insípido que ganhou legitimidade no movimento chamado “novo urbanismo” e que enalteceu a venda da comunidade e do “estilo butique” como modo de vida, criando um produto feito por agentes imobiliários para satisfazer os sonhos urbanos. Ao analisar o diálogo entre a prefeitura, os moradores e os investidores imobiliários considerando-o como sugere Herzfeld (1991), um debate cultural na prática social, procuro contribuir com o estudo de processos urbanísticos e de intervenções urbanas aprofundando o olhar para a relação de familiaridade que os moradores têm com os lugares. Conhecer o saber local a partir das dinâmicas dos moradores, seus valores e suas memórias pode fornecer informações importantes sobre os lugares, que devem ser incorporadas ao saber técnico e especializado do ambiente político e burocrático do planejamento das cidades. Portanto, após o anúncio da prefeitura da capital de realizar sete audiências públicas para discutir com a população uma proposta de Operação Urbana Consorciada para a região, lanço mão da câmera participante, dinâmica de apresentar ao grupo o material registrado durante o work de campo, para filmar essas audiências com os moradores da (OJB) registrando, sobretudo a forma com que as pessoas veem ou imaginam a região.
Habitar as ruas e os modos de fazer política no cotidiano
Autoria: Ana carolina Amorim da Paz
Autoria: O presente work compreende um breve esforço em identificar e compreender práticas políticas desenvolvidas por pessoas que habitam as ruas na tentativa de acessar e garantir direitos em situação de grande vulnerabilidade social, econômica, emocional e de saúde. Trata-se de uma tentativa de apontar alguns aspectos de como esses corpos experimentam, compreendem e exercem a política no cotidiano, em suas relações próximas e rotineiras de sociabilidade, procurando explorar a dimensão simbólica dos direitos, o modos de acessá-los, as concepções e dilemas acerca do usufruto do espaço urbano e a maneira pela qual as relações de conflito e poder emergem, adquirem significados e como esses sentidos orientam suas ações no cotidiano da cidade. Para tanto, utilizo como dados empíricos anotações de caderno de campo desenvolvidas durante pesquisa de mestrado, entre 2014 e 2016, no centro da cidade de Cabedelo/PB, agora analisados na perspectiva da pesquisa de doutorado em antropologia – PPGA/UFBA. Acredito que ao voltar à atenção para o cotidiano de parte dessas vivências podemos ter acesso não só a pluralidade das práticas e interações, mas também os sentidos e particularidades que a política pode assumir em tal ambiente, desvelando representações, corporalidades e modos de agir através das quais essas pessoas criam e reivindicam seu lugar nas relações locais. Sendo assim, sigo as indicações de Machado Pais (2003, p.29), do cotidiano como uma “rota de conhecimento” para traçar um diálogo com a chamada Antropologia do direito, da cidade e urbana, além das teorias já consolidadas sobre a temática das pessoas em situação de rua (PSR). Trago como aporte teórico autores como Agier (2015), Trindade (2012), De lima (2009), Oliveira (2010), Foucault (1996; 2013), entre outros. A partir desse diálogo, podemos observar como esses corpos que habitam as ruas lidam com a dimensão normativa e suas formas institucionalizadas, lançam mão da inventividade em suas existências e exploram a potência do habitar nas ruas, alcançando, mesmo que de forma insuficiente, circunstancial e marginalizada, o direito à centralidade, entre outros. Com isso, podemos suspeitar se certas práticas desenvolvidas nessas condições de vida podem ser entendidas como práticas políticas de fazer acessar um direito à cidade.
Imaginar e habitar a cidade: reflexões sobre ocupação, arte e resistência
Autoria: Francine Nunes da Silva
Autoria: Em 2014, um casarão abandonado no centro da cidade de São Paulo foi ocupado por um grupo de artistas e produtores culturais para a organização de um ateliê compartilhado de criações artísticas e posteriormente espaço de moradia. Construído em meados de 1920, o imóvel teve várias finalidades e modificações na estrutura. E atualmente é intitulada Casa Amarela Quilombo Afroguarany. Os ocupantes procuram mobilizar localmente ações sócio-culturais que trazem no seu bojo as temáticas da arte, ocupação e resistência voltadas para as matrizes afro-indígenas, por isso a denominação "Quilombo" e "Afroguarany". A realização de atividades ligadas à música, arte urbana (TAG, pixo e graffiti), audiovisual, dança, teatro, performance, ensaio, bazar, sarau e festa de Dancehall confere ao território ocupado uma re-existência e sociabilidade que espelham referenciais culturais e coletivos da vida urbana. A conflitualidade no centro de São Paulo em relação principalmente a habitação é recorrente e os moradores das ocupações, como a da Casa Amarela, sofrem com as inúmeras tentativas de ordem de despejo e reintegração de posse. Assim, pode-se redimensionar a cidade a partir da chave da precariedade de condições e desigualdades sociais, econômicas, políticas, institucionais, laborais que afetam os habitantes, mas sobretudo pela luta por moradia digna como afirmação e organização por direitos de participação e acesso aos serviços públicos e bens culturais que a região central proporciona. Dentro dessa perspectiva as zonas centrais são caracterizadas pelas recorrentes remodelações que reiteram os processos de afastamento do 'outro', discriminação e preconceito. O presente work busca a compreensão da ocupação enquanto habitação e espaço de ação cultural, artística e politica a partir das falas e narrativas dos residentes em meio a situações de negociação, representação e classificação ancoradas em fatores como, etnia, gênero, origem migrante, raça, idade, opção politica, ocupação profissional. As conclusões preliminares trazem reflexões segundo uma abordagem agonística, de que a arte e a "cultura de rua, negra e periférica" podem intervir e ressignificar territórios em um contexto de dissenso em torno de temas silenciados e submersos que o consenso neoliberal tende a obscurecer e obliterar. Ao escapar das essencializações, das histórias oficiais e dos olhares disciplinares, a pesquisa etnográfica opera no sentido de que as conexões entre arte, cultura e política revelam que as formas de resistência podem criar engajamentos de cunho estético e crítico e um tipo de responsabilidade coletiva pela vida, pelas formas de habitar e pelo uso criativo e alternativo de imaginar a cidade.
Lugares de luta e resistência: classes populares, espaços políticos e intervenção cinematográfica na reestruturação urbana do Recife/PE
Autoria: Wendell Marcel Alves da Costa
Autoria: Este work tem por objetivo discutir sobre os lugares de luta e resistência que constituem formas de proposição de negociação em relação à questão da reestruturação urbana por qual passa a cidade do Recife/Pernambuco. Na última década, a cidade recifense tem se transformado num palco de resistência diante dos projetos de remodelação da paisagem e mobilidade urbana, produzindo lugares de luta política de classes populares e médias urbanas. Estes lugares de luta e resistência estão imbricados nos departamentos autárquicos do governo (na figura de deputados e vereadores), em movimentos sociais de cunho urbano-produtivo liderados pelas classes populares que reivindicam o direito à cidade e em setores da produção cultural e cinematográfica (produtores, diretores, fotógrafos, atores/atrizes). O cenário da reestruturação urbana do Recife tem fomentado iniciativas cinematográficas que representam os desafios, os paradigmas e os discursos construídos sobre a questão urbana recifense, como nos filmes de ficção dos diretores Marcelo Pedroso, Gabriel Mascaro e Kleber Mendonça Filho. Os lugares de luta e resistência estão presentes, assim, em duas modalidades de intervenção, a burocrática e a estética – a governamental-capitalista e a cinematográfica. Neste sentido, elaboramos aqui uma discussão sobre estas duas modalidades de intervenção política e estética no centro urbano do Recife contemporâneo, dialogando com a Antropologia Política, Urbana e as formas expressivas de constituição e representação dos discursos sociais.
Notas sobre habitar o urbano: trajetórias e circuitos em condomínios populares na Zona Oeste do Rio de Janeiro
Autoria: Martha Cavalcante Rodrigues, Edson Miagusko
Autoria: As cidades atualmente possuem muitas características e são constituídas pela heterogeneidade dos espaços políticos, sociais e culturais. Devido a pluralidade de observações que se pode fazer sobre os espaços urbanos, as cidades se tornaram um grande campo de reflexões teóricas, um lugar favorável para os estudos da vida social, por conta das manifestações da natureza humana não serem somente visíveis como também acentuadas (PARK, 1999). De acordo com Park (1987), encontramos a cidade enraizada nos hábitos e costumes dos seus habitantes e temos por consequência disso uma organização não apenas moral como também uma organização física, que interage de forma recíproca. Neste sentido, se tornou comum nas sociedades contemporâneas o agrupamento e ordenamento de indivíduos semelhantes nos espaços urbanos. As cidades não são apenas um emaranhado de indivíduos, elas também produzem significados. Elas se tornam lugares de configurações dos espaços urbanos, desenhados pela intensificação dos problemas sociais como a precarização dos works, deterioração dos espaços coletivos, privatização dos serviços públicos, e estabelecimento de formas de segregação e violência. A distribuição dos indivíduos nos espaços sociais permite “manter à distancia, as pessoas e as coisas indesejáveis, ao mesmo tempo em que se aproxima de pessoas e coisas desejáveis” (Bourdieu, 1997, p.164), e a partir dos cenários urbanos podemos observar as desigualdades presentes nas grandes cidades. No cenário atual das habitações nos territórios do Rio de Janeiro, os condomínios populares tem ganhado cada vez mais espaço na cidade e se tornado um meio da população desprovida de recursos financeiros conseguir uma moradia. E o que se tem observado é o alto investimento dessa produção de moradia destinadas à população de baixa renda, por meio do Programa Minha Casa, Minha Vida. O objetivo deste work é apresentar uma breve etnografia dessa forma de habitar a cidade através das trajetórias de mulheres em condomínios populares do MCMV no bairro da Zona Oeste do Rio, com o intuito de perceber as sociabilidades urbanas que perpassam suas trajetórias, além de refletir sobre esta política pública habitacional e seu impacto na vida dos moradores. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica, levantamento de dados sobre os empreendimentos do MCMV em curso no Rio de Janeiro, além da observação participante com entrevistas não estruturadas.
O Portal Memória Ambiental e Memória das Águas Urbanas – Porto Alegre, RS.
Autoria: Matheus Cervo, Felipe da Silva Rodrigues
Autoria: O portal Memória Ambiental é resultado de um projeto realizado pelo grupo de pesquisa Banco de Imagens e Efeitos Visuais (BIEV) do Laboratório de Antropologia Social/PPGAS/UFRGS desde 2009. Iniciado com a construção da pesquisa antropológica em hipermídia denominada “Habitantes do Arroio: estudo de conflitos de uso de águas urbanas, risco, saúde pública e comunidades étnicas em Porto Alegre-RS” e que resultou em um blog e um documentário interativo disponíveis na internet, o projeto incialmente refletia especificamente sobre os usos e abusos das águas do Arroio Dilúvio. Financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e desenvolvido pelo BIEV e pela ONG Instituto Anthropos, refletiu-se principalmente sobre as condições ambientais dos recursos hídricos em questão contrapostos à diversidade sociocultural de representações simbólicas, ethos e visão de mundo das populações que habitam a micro bacia estudada. Com o posterior desenvolvimento do projeto coordenado por Ana Luiza Carvalho da Rocha e Cornélia Eckert, a pesquisa desenvolvida sobre os processos de metropolização e os consequentes impactos para a gestão de águas urbanas nas modernas sociedades complexas se tornou apenas um dos eixos que estruturam a plataforma atual. Compreendendo a “questão ambiental” através da ótica temporal do viver citadino, propomos uma aproximação entre a etnografia da duração (ECKERT; ROCHA, 2013c) e as múltiplas perspectivas sobre o meio ambiente trazidas pela perspectiva antropológica. Compreendendo que o “Processo Civilizatório” Ocidental (ELIAS, 1985) desencanta e racionaliza a Natureza através de uma concepção específica de inter-relação entre ser humano e ambiente, pretendemos complexificar o que é considerado hoje como crise ambiental ao expressar a heterogeneidade cultural existente em Porto Alegre em relação às águas, aos animais, aos vegetais e outros não-humanos que compõem a paisagem do urbano. Refletindo sobre a utilização de recursos multimídia como meio de ampliar a divulgação dos resultados da pesquisa etnográfica nas e das cidades para além dos muros da universidade, o processo de desterritorialização e desmaterialização dos suportes físicos tradicionais revela novos desafios para a representação da pesquisa social. A pesquisa aqui proposta se concretiza através da construção de um banco de conhecimento que incorpora escritos, crônicas, narrativas biográficas, cartografias, fotografias, vídeos, sons, etc. Com a construção de coleções de documentos de diversos fundos de origem através de categorias e palavras-chave, utilizamos as ferramentas de georeferenciamento do My Maps da Google para criar uma experiência ao leitor-navegador (CHARTIER, 1999) com o mapa da cidade.
Pelotas-RS pelas suas margens: a patrimonialização como expressão das múltiplas formas de habitar a cidade.
Autoria: Francisco Luiz Pereira da Silva Neto, Louise Alfonso Flávia Rieth
Autoria: A proposta é de localizar este work dentro de uma antropologia urbana que interpreta a cidade não como uma dimensão externa aos habitantes, globalizante e que pode ser analisada na sua totalidade, mas perceber a cidade como um objeto virtual, constituída por disputas de narrativas sobre seus territórios. Para tratar este tema, partimos da tensão com a cidade normativa através de uma reflexão sobre suas margens. Pensando a agencia das narrativas de grupos subalternos a partir de processos de patrimonialização. A importância de um conceito oficial de patrimônio se consolida na atualidade pelo tombamento do conjunto histórico de Pelotas e registro da região doceira de Pelotas e Pelotas antiga que ocorreram em maio de 2018 pelo IPHAN. Desde a década de 1950, com um levantamento de mais de mil imóveis inventariados, com legislação municipal específica sobre o tema desde a década de 1980, com ações do Programa Monumenta, constantes atividades junto à comunidade sobre um conceito de patrimônio que se queria fortalecer, sobre a importância da preservação e realização de evento anual denominado Dia do Patrimônio ganhador prêmio Rodrigo Melo Franco, ações que demonstram a centralidade do conceito de Patrimônio na definição de uma perspectiva de cidade. As pesquisas vinculadas ao Grupo de Estudos Etnográficos Urbanos (GEEUR) da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) têm evidenciado um processo importante de disputa de narrativas a partir deste conceito de patrimônio reforçado por décadas. Ocorre que grupos inicialmente invisibilizados nas narrativas oficias da cidade passam a demandar o reconhecimento de suas práticas e saberes como constituidores da história de Pelotas. Mais do que se conformar à perspectiva estabelecida sobre patrimônio, propõem uma ressignificação desse mesmo conceito. Aquelas narrativas oficiais que desvinculam o sal do açúcar, a opulência do período charqueador invisibilizando o passado da escravidão, são questionadas por diferentes grupos que se apropriam do patrimônio. Comunidades negras passam a reivindicar sua presença na constituição do centro histórico e da cidade, o que tem ocasionado tensões no uso destes bens. Também com a transferência do centro administrativo da cidade para a área do Passo dos Negros, estimulando a especulação imobiliária e ocasionando a remoção de moradoras/es, a patrimonialização de bens relacionados ao sítio charqueador vêm sendo reivindicada para garantir a permanência destas comunidades em seus territórios tradicionais. Estes estudos nos possibilitam perceber uma importante ação na definição dos territórios da cidade, que passa por uma dialética entre margem e centro, dimensão relevante para definir a própria concepção de centro urbano em disputa por modos de habitar a cidade.
Poéticas e políticas do território nos filmes “Dia de Voltar” e “Nos Pódios da Draga”
Autoria: Alexandre Fleming Câmara Vale, Elisa Alencar
Autoria: Os projetos “Poéticas do Poço: etnografias e imagéticas compartilhadas” e “Vidas na Orla” constituíram-se como empreendimentos de pesquisa colaborativa e inclusiva acerca das condições de vida e existência da população que habita a comunidade do Poço da Draga, situada em “área nobre” de Fortaleza, o Bairro Praia de Iracema. No âmbito desses projetos, dois filmes especificamente tematizaram as questões ligadas à territorialidade, aos conflitos habitacionais e os deslocamentos na cidade: “Dia de Voltar”, de Alexandre Vale e “Nos Pódios da Draga”, de Elisa Alencar. O primeiro narra a trajetória de duas famílias que foram removidas para bairros da periferia de Fortaleza, mas que, em ano eleitoral, retornam ao Poço da Draga para votar, dado que nunca trocaram seus endereços eleitorais. O segundo narra as lutas pela apropriação de uma quadra de esportes para a prática do futebol por garotas que habitam o Poço da Draga e que são amantes daquele esporte. Ambos os filmes constituem matéria-prima privilegiada para pensar, tanto numa perspectiva exógena (Dia de Voltar) quanto endógena (Nos Pódios da Draga), a importância do binômio espaço-território para refletir sobre os processos participativos de “auto-representificação” e “reflexividade” da comunidade do Poço da Draga, especialmente no que se refere aos seus modos de viver, habitar e responder ao processo de gentrificação pelo qual o Bairro Praia de Iracema vem passando ao longo das ultimas três décadas. Para moradores e moradoras que resistem, gentrificação, em um “bairro nobre” e cobiçado do ponto de vista do mercado imobiliário, é quase sinônimo de novas investidas de remoção, uma realidade com a qual a população da localidade lida desde sua fundação.
Preconceito de moradia: moralidades e violências contra LGBTs no contexto urbano de São Paulo
Autoria: Gustavo Belisário d'Araújo Couto
Autoria: Este work é fruto da pesquisa de doutorado em curso na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) sobre o feixe de relações de LGBTs e suas casas - as que moram, as de suas famílias, de locatários e anfitriões. A pesquisa é uma etnografia feita com LGBTs que frequentam movimentos de moradia na cidade de São Paulo. Para isso, faço uso de um termo utilizado pela travesti Raquilana. Em uma entrevista para o jornalistas livres sobre LGBTs em uma ocupação do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) na cidade de Mauá (SP), Raquilane diz que sofre preconceito de moradia, devido a sua dificuldade de alugar um lugar para morar. Neste work, uso "preconceito de moradia" como categoria analítica que compreende o conjunto de entraves e constrangimentos que separam LGBTs de suas casas. Para isso, também recorro a alguns elementos de história urbana da cidade de São Paulo para analisar o projeto urbanístico da cidade - passando pela constituição dos cortiços do centro da cidade, o sonho da casa própria, o Largo do Arouche - e sua intenção normalizadora dos corpos.
Reforma do Bar do Parque, em Belém do Pará: dinâmicas de ocupação e repercussão
Autoria: Victória Ester Tavares da Costa
Autoria: Ponto de encontro de músicos, poetas, prostitutas que lá encontravam seus clientes e moradores das proximidades ou das ruas, o Bar do Parque era conhecido desde os anos 1960 por sua característica mais intensa: a boemia. Rastro da Belle Époque em Belém, a arquitetura europeia de casarões e prédios localizados no centro da cidade contém certa estrutura histórica. Próximo ao centenário Cine Olympia e ao Theatro da Paz, na Praça da República, o Bar do Parque é o local de observação deste texto. Em 2017, o anúncio de um edital municipal que previa encontrar novos gestores para o Bar, que fizessem modificações na estrutura, trazendo uma “revitalização conceitual” baseado em um novo modelo “comum na Europa”, segundo o próprio documento oficial, fez com que a mobilização acerca das possibilidades de descaracterização deste espaço fossem sentidas por seus frequentadores e simpatizantes. Apesar das petições e reivindicações, o Bar do Parque foi fechado e reinaugurado no início de agosto de 2018, cuja repercussão foi notada principalmente nas mídias sociais, em que há nítida divisão de opiniões no que tange a reforma, seu público e às questões de gestão. Partindo de Certeau, sobre um espaço tornar-se local (“A invenção do cotidiano”, 1990) a partir das características que se desvelam nas interações entre as pessoas e os elementos presentes, então tem-se, hoje, várias percepções sobre o Bar do Parque. Neste ínterim, o uso e a ocupação do espaço tornou-se tema de debates (por vezes fervorosos) cujos resultados repercutiam diretamente no usofruto do Bar e seu entorno. A reforma trouxe mais que mudanças físicas à paisagem deste trecho do bairro da Campina, gerou mobilização de grupos em relação a esta área, seja na convocação dos batuques na praça, seja nos clientes (novos ou antigos) do bar ou mesmo curiosos, à distância. O abandono público antes da reforma é unanimidade. As alterações nos preços, na estrutura, nos serviços oferecidos e, principalmente, no público, são os questionamentos mais frequentes nas mídias digitais, mas foi também o que gerou uma dinâmica de ocupações. Assim, através de etnografias pelo próprio Bar do Parque e do contato com frequentadores e ex-frequentadores, acrescentarei à pesquisa algumas das opiniões emitidas na internet (Kozinets, “On Netnography: Initial Reflections on Consumer Research Investigations of Cyberculture”, 1998), elencando pontos que desvelam as diversas percepções da reforma no âmbito do prédio e de seu entorno. Deste modo, discuto também a partir de Agier (“Do direito à cidade ao fazer-cidade: O antropólogo, a margem e o centro”, 2015) e de Magnani (“Etnografia como Prática e Experiência”, 2009) de que forma as práticas sociais que estão ocorrendo podem refletir diretamente neste recorte da cidade.
Revalorización urbana y pinturas calleras en dos barrios centrales de Montevideo.
Autoria: Emilia Abin Gayoso
Autoria: Las áreas centrales de la ciudad de Montevideo están en proceso de revalorización urbana. Esto se refleja particularmente en los dos barrios que se encuentran en los extremos de la avenida principal de la ciudad, Av. 18 de julio: Ciudad Vieja de Montevideo y barrio Cordón Norte. Ambos barrios presentan un reacondicionamiento de los espacios urbanos, espacios púbicos, una fuerte inversión inmobiliaria nacional y extranjera con aumento del valor del suelo, y segregación socioespacial. En el caso de Ciudad Vieja, la revalorización se apoya en la resignificación del barrio como casco histórico con valor patrimonial. Se promueve un ‘habitar el patrimonio’, manteniendo siempre su carácter de City y zona con la mayor densidad de poder (político, económico y financiero público y privado) de la ciudad. En el caso del barrio Cordón Norte se registra una creciente construcción de edificios para habitación y oficinas inteligentes. Se define como una zona cerca de todo (Ministerios, bancos, Banco de Previsión Social, Dirección General Impositiva, servicios médicos, varias facultades de la Universidad de la República, liceos, Universidad del Trabajo, escuelas públicas y privadas, clubes deportivos, tiendas comerciales); se promueve un habitar el centro o la centralidad de la capital. A través de un recorrido por estos barrios, del relevamiento fotográfico de pinturas murales callejeras y grafitis contra la gentrificación y de conversaciones con vecinos-residentes, autores de las pinturas/pintadas, se busca indagar sobre el recurso a pinturas y murales en la calle en diálogo con el proceso de revalorización y embellecimiento del espacio urbano en unos casos y marca de pertenencia y resistencia al proceso en otros. El objetivo de esta ponencia es reflexionar sobre la disputa por el espacio urbano y el derecho a la ciudad, a la centralidad de la ciudad de Montevideo, en el marco de la revalorización y sus efectos de segregación socioespacial.
Revitalizar a “Rodô”: entre conflitos, alianças e diferenças
Autoria: Vladimir Eiji Kureda, Guilherme Passamani
Autoria: O presente work tem como finalidade apresentar as reflexões realizadas sobre o processo de revitalização na antiga rodoviária de Campo Grande – MS. Ressalta-se que esse work é parte do work de Conclusão de Curso em Ciências Sociais concluído no ano de 2017 na UFMS. O foco da análise centra-se na compreensão da antiga rodoviária, conhecida popularmente como “Rodô”, situada numa área próxima ao centro comercial da cidade, como um espaço em disputa, aonde se congrega uma heterogeneidade de sujeitos que produzem relações com o lugar e entre si. Essas disputas em torno da antiga rodoviária, que envolvem relações de conflitos e alianças, se manifesta com o processo de revitalização. Nesse sentido, o work traz as pessoas em situação de rua, evangélicos e instituições estatais, que estão diretamente relacionadas com o processo citado acima, destacando algumas de suas formas de uso, contra-uso, territorialização, representações e intervenções. Do ponto de vista metodológico, a análise é fruto de dados produzidos nas observações realizadas no work de campo de cunho etnográfico, bem como de documentos públicos e entrevistas semiestruturadas. No que tange a algumas inferências, pode-se afirmar que: parte dos comerciantes situados nas imediações da antiga rodoviária reitera a necessidade de reaquecer a economia local, almejando-se o retorno da clientela formal e dos turistas que passam pela cidade, através de projetos implementados pelo Estado, que levariam, consequentemente, à retirada das pessoas em situação de rua do local; além disso, as ações caritativas de evangélicos para com a população em situação de rua é concebida por alguns comerciantes como uma prática pouco “solucionadora” e que colabora para a manutenção desses sujeitos no universo das ruas. Logo, algumas dessas igrejas são percebidas pelos comerciantes como um entrave para a revitalização local; por fim, em dois documentos estatais, de instituições ligadas ao planejamento urbano municipal, aparece a necessidade de ocupar “áreas vazias” de regiões da cidade, que incluem a antiga rodoviária, bem como resolver o “problema social” do bairro, corporificado na figura de “mendigos, usuários de drogas e moradores de rua”, ou seja, o Estado torna visível esses sujeitos ao categorizá-los como um “problema social” que precisa de intervenção, enfatizando o uso de drogas nesse contexto, bem como trata esse espaço da cidade como um lugar que carece ser ocupado por novos equipamentos e sujeitos, logo, gentrificado.
Uso dos espaços, etnografia visual e embates (quase) silenciosos: aspectos de ‘contemplações de passagem’ na comunidade Vila Matos em Salvador/BA
Autoria: Luciano Magnus de Araújo
Autoria: A cidade guarda mistérios, disso não há dúvidas. A cidade vivida por aquele-aquela que cria familiaridades é um ente de conhecimento-desconhecimento. A cidade pode ser desbravada, apropriada, consumida,... A relação do indivíduo que vive essa cidade é mediada por categorias e entendimentos dinâmicos, de falas várias, de interpretações fluidas e fugidias. E para aqueles-aquelas que não a conhecem, como se dá a natureza dessas percepções? Desconhecer e desconhecer-se na cidade são coisas próximas e distantes. Como é definido um primeiro contato com certa experiência urbana? Que elementos, de fato, mediam essa relação? O que é o ente cidade que exija ou possa ser vista como condição - meio-fim - para abordagens-entendimentos sobre e para sua própria exploração e envolvimento? Essas questões fazem parte de um contexto de análise que pode servir para pensar estratégias para viver em e a cidade. De toda forma, é um sugestionamento que carece de adoção espontânea: ser-estar como indivíduo urbano, muitas vezes, prescinde um saber sê-lo. Mas não custa tentar outras maneiras de ser-estar...A presente proposta provoca olhares de passagem tendo como motivo protagonista a comunidade de Vila Matos na cidade de Salvador, Bahia. Observar o uso do espaço urbano, em área nobre do município soteropolitano, contrastando com lugares da cidade organizadas pelo poder especulativo do capital e registrar a coexistência de ocupações entre planejadas, organizadas e outras formas de estar no lugar é nosso presente movimento etnográfico e visual. Para os recortes teóricos algumas autorias serão prestigiadas: Eckert e Rocha (2013), sobre Etnografia de Rua e estudos de antropologia urbana; Santo e Becker (2011), sobre ordenamento territorial e uso dos espaços; Mirandola Jr, Holzer e Oliveria (2014), sobre o lugar do espaço e outras contemplações; Mongin (2009), sobre a experiência de explorar a cidade na era da globalização; Carlos, Santos e Alvarez (2018), sobre resistências, centralidades periféricas e segregações espaciais.
Vitrine da Cidade? Os bairros centrais no Brasil e na França
Autoria: Alzilene Ferreira da Silva
Autoria: As cidades apresentam um impressionante processo de mutação, construções e desconstruções que imprimem na paisagem urbanas novas significações. Nesse contexto, o acelerado crescimento urbano tem promovido, como no caso dos centros centrais, impactantes transformações. De bairro valorizado, centro da vida urbana, passaram por um profundo processo de abandono, tornando-se estigmatizados. No entanto, as novas diretrizes de preservação do patrimônio promoveram alterações significativas e os centros são incorporados aos planejamentos urbanos. Assiste-se nesse horizonte o conúbio entre políticas culturais e o urbanismo. Desse modo, desde a segunda metade do Século XX as investigações sobre os centros urbanos têm ganhado mais relevância, alteraram-se substancialmente as políticas urbanas e os centros passam a ser alvo de processos de preservação e requalificação dos espaços e usos. O bairro degradado é “redescoberto” e passa a ser associado a política de desenvolvimento turístico. É conspícuo assinalar o uso crescente de estratégias de marketing para tornar as cidades cada vez mais visíveis e atrativas ao capital. O que vem gerando forte competição entre as cidades para atrair investimentos e turistas. No rastro dessas transformações assiste-se os fenômenos de revitalizações das áreas centrais degradadas e da gentrificação. Esses processos segregam o espaço e promovem também mudanças e conflitos de usos. Nesse sentido fronteiras simbólicas/físicas são erigidas revelando um cenário onde tensões e disputas pela permanência são frequentes. A partir desses construtos, o work, aqui, proposto abraça como referências empíricas os Centros Históricos das cidades de João Pessoa (Brasil) e Tours (França). Nas duas cidades investigadas o centro da cidade faz parte do perímetro protegido (Centro Histórico). Ao escutar, pensar e falar sobre os Centros Antigos, os moradores trazem à tona distintas imagens que são impregnadas de significados. Estas, por sua vez, são primordiais para o entendimento acerca dos Bairros. O fito desse work consiste em compreender a maneira como esses Bairros são vividos/entendidos pelos seus habitantes e como as requalificações urbanas tiveram também como desdobramentos disputas e alterações significativas no modo de permanecer e habitar os Bairros. Um rico material empírico foi coletado no Brasil e na França. Foram realizadas recolhas em diversas Bibliotecas de Universidades e Instituições, coleta de dados em Arquivos e Órgãos Públicos. As entrevistas com atuais e antigos moradores, dos dois países, foram primordiais para a elaboração da etnografia. Além disso, o uso de fotografia contribuiu sobremaneira para a elaboração do estudo. Assim, a pesquisa etnográfica permitiu perceber as diferenças/semelhanças que marcam as duas realidades.
Vizinhos distantes: reflexões sobre a "Alta" de Coimbra, Portugal
Autoria: Marcia Regina Medeiros Veiga, Monalisa Dias de Siqueira
Autoria: A “Alta” do centro histórico de Coimbra, cidade centro-litorânea de Portugal, é um território paradoxal. Com uma história milenar que se confunde com a história da cidade e do próprio país, sua centralidade não é somente geográfica. Abrigando, outrora, a realeza e a nobreza portuguesas, a “Alta” sempre se contrapôs, hierarquicamente, à “Baixa”, território plebeu marcado pelo movimento do povo coimbrão: os artesãos, os comerciantes de rua, os feirantes, as lavadeiras do rio Mondego, as tricanas vendedoras de água. Em tempos não tão remotos, a “Alta”, ela própria, já foi cheia de vida e movimento, sendo uma região residencial, cercada de comércios e serviços os mais diversos. A ocupação da “Alta”, durante o período do Estado Novo, pela Universidade de Coimbra, a primeira universidade portuguesa; uma das pioneiras no mundo todo, desalojou uma parte significativa da população e dos serviços daquele território. Hoje, para além dos prédios da Universidade, a “Alta” comporta um edificado envelhecido e degradado, ocupado, em grande parte, por estudantes e por uma população bastante idosa, populações essas que vêm sendo, pouco a pouco, sufocadas pelos empreendimentos turísticos, que vêm tomando conta dos edifícios e do território como um todo. Pretendemos, com esta comunicação, refletir sobre “vizinhos” que são, a um tempo, próximos e distantes – patrimônio e turismo; velhice e juventude; hierarquia e irreverência –, em seus conflitos cotidianos pela apropriação, construção e reconstrução de um espaço cada vez mais fragmentado e contraditório.
‘Tá no jornal, tá na rua’ ou um diálogo entre Antropologia e Comunicação acerca de disputas, pastiches e paisagens na fisionomia urbana contemporânea de Belém do Pará, na Amazônia
Autoria: Enderson Geraldo de Souza Oliveira
Autoria: Não é raro notar em Belém, em especial em áreas mais habitadas ou mesmo frequentadas principalmente por pessoas de classe média e alta, edificações, empreendimentos ou ainda outros locais que possuem, em sua arquitetura ou mesmo “nomenclatura”, expressões e/ ou referências a outras regiões ou lugares, especialmente estrangeiras, de fora do Brasil. O mesmo ocorre nos cadernos de “Negócios” dos jornais da capital, principalmente - e não por acaso desde a capa - dos dominicais, com anúncios e previsões de novos empreendimentos imobiliários e/ou de outras ordens na capital paraense. Neste work discuto então tais “estrangeirismos”, notando tal processo não apenas como a reprodução de termos de outra região do país ou mesmo fora do Brasil, mas sim como indicadores da tentativa de se buscar outra vivência ou mesmo experiência através de elementos estéticos: os estabelecimentos; suas imagens e os jornais em que são apresentados. Mais que isso: discuto o quanto tais processos talvez ampliem hiatos ou mesmo esgarçam tênues linhas de compreensão do espaço urbano ou mesmo de apropriações ou afastamentos por parte dos sujeitos a que se destinam ou não tais “anúncios”. Levando em conta o caráter polissêmico de tais discussões, como afirma Flávio Leonel Abreu da Silveira (A paisagem como fenômeno complexo, reflexões sobre um tema interdisciplinar, 2009), me aproximo da categoria “pastiche”, processo estético que visa uma “homenagem” a estilos ou obras anteriores (Pós-Modernismo: A lógica cultural do capitalismo tardio, Fredric Jameson, 2002. Indo além, ciente de que “percorrer as paisagens que conformam um território, seguir os itinerários dos habitantes, reconhecer os trajetos, interrogar-se sobre os espaços evitados, é evocar as origens do próprio movimento temporal desta paisagem urbana no espaço” (Etnografia de Rua: Estudo de Antropologia Urbana, Cornelia Eckert e Ana Luiza Carvalho da Rocha, 2003) proponho ainda o diálogo entre Antropologia e Comunicação para compreender tal utilização de terminologias nos referidos empreendimentos, que apontam para um curioso e profícuo diálogo entre a paisagem urbana e seu “prolongamento” impresso em jornais, que talvez indiquem para um modo peculiar de consumo ou ainda de aderência às imagens e significados que “carregam” e instigam.
“Posso perder a carteira, mas não perco a identidade”: a linguagem da pichação como forma de ação e reapropriação na cidade do Rio de Janeiro.
Autoria: Vinícius Moraes de Azevedo
Autoria: Misteriosas assinaturas monocromáticas feitas com spray de tinta que aparecem repentinamente em diferentes alturas e superfícies da cidade são alguns dos elementos centrais que compõem o visual do ambiente urbano carioca. É impossível circular pelas ruas, sobretudo as das regiões periféricas da cidade, sem encontrar paredes repletas de pichações. Indivíduos, majoritariamente homens, de diferentes níveis econômicos e educacionais, são os autores dessas caligrafias proibidas. Com o objetivo de garantir notoriedade entre seus pares, eles espalham seus nomes e criam uma forma específica de se comunicar usando o corpo da cidade como seu suporte base. Trata-se de uma linguagem codificada que só pode ser acessada pelos iniciados nessa cosmologia. No contexto de urbanização espetacular observado no Rio de Janeiro, a linguagem da pichação é compreendida como antagônica à noção normativa de uso apresentada pelos setores hegemônicos da sociedade. Esse é um dos fatores do complexo jogo de valores que faz com que a pichação e seus praticantes sejam violentamente combatidos por seus opositores. Para sobreviver e dar vida a uma estética construída coletivamente, os pichadores elaboram uma lógica específica de ocupação dos espaços. Essa metodologia de (re)significar o ambiente urbano, tanto com o corpo como com suas assinaturas, consiste em uma atuação noturna e furtiva na qual meus interlocutores visam paredes e muros que garantem destaque visual e durabilidade para as pichações. Eles fazem uso de brechas e realizam manobras com o intuito de driblar o moderno sistema de segurança citadino. O corpo não pode ser visto, mas deixa a marca de sua presença em diversos espaços e alturas da cidade. Imersos na atividade de produção de seus nomes, esses interlocutores iniciam trajetórias que entendo como carreiras na pichação. São processos de progressão sequencial, marcados por etapas de transição, isto é, mudanças significativas dentro de um sistema, a afetar diretamente o indivíduo e sua subjetividade, e alterar, portanto, seus projetos, sua forma de atuação, de uso do ambiente urbano e sua significação. O objetivo central do work é, através da pesquisa etnográfica, compreender como indivíduos socialmente estigmatizados obtêm prazer, reconhecimento e satisfação pessoal através de uma prática que, em aparência , oferece mais problemas do que benefícios. Nesse contexto, abordo a pichação como código comunicacional, ação política de ocupação do território, e forma de reconhecimento e lazer, a engendrarem especificidades da cultura de rua carioca. Nesta comunicação, apresento as questões centrais da dissertação. Essas problematizações serão apontadas através da exibição de material iconográfico.