Cinque Terre
GT 057. Processos e dinâmicas no ciberespaço: divergências, dissidências, usos e contra-usos em relação à experiência de si
Laura Graziela F. de F. Gomes (Universidade Federal Fluminense) - Coordenador/a, Eliane Tânia Martins de Freitas (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE) - Coordenador/a
Pretende-se reunir trabalhos que discutam dinâmicas que problematizem continuidades off/online, além das articulações entre público/privado/intimidade na rede, a fim de apreendermos modos de subjetivação que valorizem engajamentos mais exclusivos com o online. Mesmo reconhecendo os usos instrumentais off-line da rede, incluímos dinâmicas dissidentes/divergentes e práticas de usos/contra-usos que requerem mais reflexividade e experimentação com/na rede. Pensamos em questões de gênero/sexualidades dissidentes contemporâneas também como fenômenos próprios da cibercultura, resultantes de seus propiciamentos, não apenas na busca de se visibilizarem, mas também de modo a valorizarmos sistemas classificatórios nativos cujas categorias sugerem experimentações que não visam tanto o off-line. Outra questão relevante refere-se ao trabalho na rede e de que modo ele sinaliza desafios e propiciamentos quanto às alteridades e diversidades relativas aos entes humanos/não-humanos que podem conduzir a novos regimes de self. Também incluímos modos do fazer político, que se radicalizam pelos usos mais táticos e reflexivos de se lidar com a rede e a própria informação. Se empresas e corporações beneficiam-se dos rastros deixados por usuários, novas gerações deles vêm investindo em modos de socialização política propriamente digital, o que dá origem a fatos políticos novos, próprios daquele meio, bem como novas ferramentas e novas sociações delas decorrentes.
Resumos submetidos
A produção e experimentação de si na rede fetichista FetLife
Autoria: Raíra Bohrer dos Santos
Autoria: O work aqui proposto é decorrente de uma pesquisa em andamento. Emerge da trajetória de pesquisa etnográfica entre graduação, mestrado e seus desdobramentos até o momento no doutorado em curso, que mantém em comum o foco nos desafios e estratégias metodológicas em contexto digital e sexual. Assim como se evidencia o caminho interconectado entre os ambientes e plataformas e os decorrentes campos de pesquisa. Ao seguir o fluxo dos interlocutores de pesquisa, descobri o FetLife como uma rede expoente para reunião de praticantes e interessados em BDSM e fetiche. Com um olhar mais atento, por meio da criação de um perfil nessa rede social para fetichistas em meados de 2015, percebi diferentes dinâmicas e usos feitos pelos usuários. A partir dessas observações, a rede social FetLife, suas dinâmicas e usos, tornaram-se ambiente e objeto da pesquisa atual. A plataforma FetLife, enquanto marco central de encontro entre praticantes e curiosos de BDSM e fetiche, tornou-se terreno extremamente fértil para compreensão das expressões sexuais do nosso tempo. Aproximo-me da perspectiva de que a rede social fetichista faz parte de um ambiente digital capaz de comportar subjetividades e o imaginário do ser humano, através da elaboração de identidades, corporalidades, sociabilidades, construção e experimentação de si. Apesar de a rede social dar suporte e encorajar para um uso mais realista da plataforma, muitos residentes do Second Life fazem uso de perfis para seus avatares e se relacionam entre si e com os outros usuários não residentes do universo virtual. Muitos usuários criam perfis fakes com fotografias ou nicknames que não correspondem a realidade offline, ainda que existam perfis que se propõem "realistas", usando de suas identidades civis. Nesse sentido, reflito sobre as dinâmicas e usos da plataforma para compreender sociabilidades que transpõem fronteiras entre realidade e virtualidade, online e offline, falso e verdadeiro. Os eixos analíticos pensados na pesquisa demonstram um fluxo de interações que transpõem fronteiras entre as realidades digital e analógica e proporcionam encontro de perfis que se estabelecem no espectro entre os polos identitários divergentes e convergentes. O FetLife, portanto, pode ser compreendido como o epicentro de uma rede de sociabilidade que reúne universos/realidades, com fluxos e trajetórias que sobrepõem diferentes esferas. Dentro dessa rede de sociabilidades, estabeleço como fio condutor da pesquisa as práticas sexuais fetichistas, relações sadomasoquistas, a produção de sensações por meio das narrativas, a composição do corpo para essas práticas, bem como experimentações e transformações sexuais e eróticas.
A Projeção de Mulheres Online em Personagens Femininas Hollywoodianas
Autoria: Luiza Santos Magalhães
Autoria: Este work decorre de um recorte de pesquisa monográfica focado em mulheres que escrevem críticas da “cultura pop” a partir de um ponto de vista feminista em blogs, trabalhando com as temáticas de discurso cinematográfico e projeção através da identidade de gênero. Partindo do contexto amplo em que questão de gênero é interpretada como natural, quando se trata de uma construção social, e em que o cinema, como indústria cultural, pode difundir discursos que definam essa questão. Aqui, foco na análise de como, através de críticas fílmicas em sites na internet, mulheres definem sua feminilidade e o que as representa, sob um crescente discurso de “empoderamento” (LEÓN, 1997), cada vez mais discutido no ciberespaço, tendo como objetivo descrever o que seria o gênero feminino para elas a partir de seu consumo de filmes, principalmente os hollywoodianos, voltados para o “público em massa”, demarcando, também, a sua relação entre personagens e a projeção das espectadoras sobre elas. A internet tem sido utilizada como um espaço considerado mais democrático para discussões (ressaltando que há certos marcadores sociais que definem que mais a utiliza) e ascende em um momento em que ocorre a “autocomunicação” das massas (CASTELLS apud FERREIRA, 2015), em que as informações estão postas na internet, colocadas por várias pessoas e o conteúdo é absorvido de acordo com os filtros de cada sujeito, ou seja, seus gostos e interesses, de maneira que são formados grupos entre pessoas que compartilham de opiniões convergentes, mostrando que a internet as uni além das fronteiras geográficas. Além disso, as discussões sobre femininismos se desenvolvem mais ainda através da troca de teorias e vivencias em blogs e fóruns, demonstrando que tecnologia pode ser aliada da difusão de discursos sobre gênero (FERREIRA, 2015). Os discursos sobre “empoderamento feminino” são expostos aqui através de mulheres que escrevem sobre a representação feminina em filmes hollywoodianos. Conduzo esse work através de uma perspectiva antropológica de que os sujeitos podem transitar em determinados espaços através desses aspectos e demonstrar que isso pode influenciar como eles concebem sua existência. Também é feita uma breve análise de algumas postagens de um blog de cunho “nerd e feminista”, o "Nó de Oito", em que as mulheres que escrevem buscam um “empoderamento” de personagens femininas nas produções que criticam, no qual é possível acompanhar como isso ocorre no atual contexto no Brasil. Sendo visado compreender as opiniões das mulheres que estão nesse cenário e entender como pretende-se que o gênero feminino seja representado nas discussões presentes no ciberespaço.
Colorismo e embranquecimento na rede: o racismo e a tentativa histórica de apagar a ancestralidade africana
Autoria: Jéssica Thoaldo da Cruz
Autoria: O presente work retrata as mazelas presentes na história do Brasil e seu passado marcado pela escravidão e pelo processo de embranquecimento pós-abolicionista. Em recorrência a abolição tardia no país, a elite intelectual preocupa-se em construir uma identidade nacional para o mesmo, considerando agora cidadãos negros e indígenas. Suas propostas e concepções nada incluíam esses grupos, já que tentavam através da ciência descobrir formas para expurgá-los ou embranquece-los, por meio de métodos eugenistas. Tal processo desumano ainda faz-se presente na contemporaneidade, a história e cultura afro-brasileira vem sendo dizimada e apagada da história oficial, bem como as práticas de embranquecimento que vem aniquilando a ancestralidade africana e a auto identificação, valorizando a superioridade caucasoide em detrimento de qualquer traço negroide. Desse modo, discussões sobre o racismo, colorismo, miscigenação e estética negra, vêm sendo apropriadas por influenciadoras digitais como um ato político de pertencimento étnico. As vlogueiras, como são intituladas, estão ocupando um espaço importante na Era da Informação, propiciando discussões de pautas historicamente ignoradas, bem com enaltecendo a identidade negra, combatendo assim o processo de embranquecimento. Nesse sentido, a pesquisa apresenta uma análise do conteúdo, visual e dos comentários de internautas sobre as temáticas que envolvem a discussão sobre o embranquecimento e colorismo, abordadas por cinco vlogueiras em seus respectivos vídeos disponibilizados no Youtube, uma plataforma digital mundial, discussões estas veladas pela sociedade que ainda defende a falaciosa democracia racial no Brasil.
Comunidades digitalmente imaginadas: socialidade algorítmica e militância política.
Autoria: Jair de Souza Ramos
Autoria: A partir de sua estruturação nas assim chamadas Redes Socais, as tecnologias de comunicação digital tem aprimorado e difundido uma agência algorítmica que estimula e administra socialidades digitais de forma cada vez mais ampla e pervasiva à inúmeras relações sociais. A convergência entre essa agência algorítmica e determinadas agências humanas politicamente militantes têm produzido aquilo que Weber conceituou como ação comunitária a partir da imaginação de comunidades modeladas a partir de noções de raça, gênero ou orientação sexual. O objetivo de comunicação é desenvolver analiticamente essa formulação examinando, em particular, o modo como se articulam socialidades e subjetividades nessa relação.
Corpo, casta e dominação: sentidos e estratégias de protesto online de jovens indianos no caso Mr. Dalit
Autoria: Carla Fernanda Pereira Barros
Autoria: A proposta do artigo é analisar os sentidos e estratégias de protesto online de jovens indianos no caso conhecido como “Mr. Dalit”, quando jovens de origem Dalit foram espancados no interior da Índia por outros de casta superior pelo fato de estarem usando bigodes, o que seria interditado a eles. A situação, ocorrida em 2017, gerou uma onda de protestos online em que homens de origem Dalit postaram selfies exibindo seus bigodes em plataformas como Facebook, Twitter e WhatsApp. Através de um work de “etnografia remota”, o estudo procurou discutir as dinâmicas do jogo hierarquia-igualitarismo nas tensões dos contextos offline e online.
Escrever cartas como ação política em tempos de internet: Brasil e Catalunha
Autoria: Elisenda Ardevol, Isabel Travancas
Autoria: Esta comunicação apresenta um projeto de pesquisa em andamento sobre o gênero epistolar em tempos de internet tendo como objeto as campanhas para escrever cartas para presos políticos no Brasil - cartas para o Lula – e na Catalunha, Espanha, - cartas para Jordi Cuixart e Jordi Sánchez. Apesar das diferenças entre os dois países e os motivos pelos quais estão presos, em ambos os casos foram criadas campanhas estimulando as escritura de cartas para a prisão como uma ação política. Essas cartas – milhares tanto no Brasil como na Catalunha – são escritas por pessoas “comuns” que querem expresar sua solidariedade aos presos. Também tem circulado cartas públicas escritas por celebridades, políticos e intelectuais que são divulgadas pelos meios de comunicação e reproduzidas e retwiteadas milhares de vezes nas redes. Por um lado, a privação da liberdade destes presos supõe também uma diminuição da sua liberdade de expressão, já que suas formas de comunicação com o exterior estão submetidas a um controle restrito. Eles não tem acesso à internet e portanto a única via de comunicação direta é a correspondencia. As visitas e as ligações telefónicas são limitadas. Isso reativou a escritura de cartas em uma época na qual se pensava que o gênero epistolar estava desaparecendo ou obsoleto, chamando a atenção para um grupo – os presos – que estão excluídos da comunicação digital. Por outro lado, a materialidade da carta tem um valor excepcional e sua força política é amplificada através dos meios digitais nos quais se compartilham as cartas enviadas, recebidas ou recusadas. As cartas íntimas e privadas para os presos circulam na internet assim como as cartas públicas e abertas como uma resposta popular e massiva à situação destes políticos e ativistas na prisão à espera de julgamento. Neste estudo queremos examinar como se produz esta combinação entre a digitalidade e a materialidade da correspondência e os seus efeitos na esfera da mobilização política. Para isso partimos de um work de campo preliminar baseado na reunião de mensagens nas redes sociais relacionadas com as cartas escritas, censuradas ou recebidas; assim como a participação em oficinas para escritura de cartas para os presos em Barcelona e entrevistas com diversos atores sociais envolvidos com o tema, tanto no Brasil quanto na Catalunha. Esta primeira aproximação ao campo do acompanhamento online até a observação participante e as entrevistas nos permite um contato com este fenômeno de imbricação do gênero epistolar (FOUCAULT: 1992; GOMES: 2004; KLINGER:2012 e DIAZ: 2016) com as novas formas comunicativas digitais (HORST & MILLER, 2013) e formas de ação política na rede (POSTILL & PINK, 2012) a partir do conceito de materialidade digital (PINK, ARDÉVOL & LANZENI, 2016).
Escrever cartas como ação política em tempos de internet: Brasil e Catalunha
Autoria: Isabel Siqueira Travancas, Elisenda Ardêvol
Autoria: O objetivo desta comunicação é apresentar um projeto de pesquisa em andamento sobre o gênero epistolar em tempos de internet. Seu objeto são as campanhas para escrever cartas para presos políticos no Brasil - cartas para Lula – e na Catalunha, Espanha, - cartas para Jordi Cuixart e Jordi Sánchez -. Apesar das diferenças entre os dois países e os motivos pelos quais estão presos, em ambos os casos foram criadas campanhas estimulando a escritura de cartas para a prisão como uma ação política. Essas cartas – milhares, tanto no Brasil como na Catalunha – são escritas por pessoas “comuns” que querem expressar sua solidariedade aos presos. Também tem circulado cartas públicas escritas por celebridades, políticos e intelectuais que são divulgadas pelos meios de comunicação e reproduzidas e retwiteadas milhares de vezes nas redes. Por um lado, a privação da liberdade destes presos supõe também uma diminuição de sua liberdade de expressão, já que suas formas de comunicação com o exterior estão submetidas a um controle estrito. Eles não tem acesso à internet e a única via de comunicação direta é a correspondencia, já que as visitas e as ligações telefónicas são limitadas. Este cenário reativou a escritura de cartas - quando se pensava que o gênero epistolar havia desaparecido ou tinha ficado obsoleto - e chamou a atenção para um grupo – os presos – que estão excluídos da comunicação digital. Por outro, a materialidade da carta tem um valor excepcional e sua força política é amplificada através dos meios digitais onde se compartilham as cartas enviadas, recebidas ou recusadas. Cartas íntimas e privadas circulam na internet assim como as cartas públicas e abertas e são uma resposta popular e massiva à situação destes políticos na prisão à espera de julgamento. Neste estudo examinaremos como se dá a combinação entre a digitalidade e a materialidade da correspondência e os seus efeitos na esfera política. Para isso partimos de um work de campo preliminar baseado nas mensagens nas redes sociais relacionadas com as cartas escritas, censuradas ou recebidas, assim como a participação em oficinas para escritura de cartas para os presos em Barcelona e entrevistas, tanto no Brasil quanto na Catalunha. Esta primeira aproximação ao campo - acompanhamento online, observação participante e entrevistas - nos possibilita, a partir da noção de materialidade digital (PINK, ARDÉVOL & LANZENI, 2016), um contato com este fenômeno de imbricação do gênero epistolar (FOUCAULT: 1992; GOMES: 2004; KLINGER: 2012 e DIAZ: 2016) com novas formas comunicativas digitais (HORST & MILLER, 2013) e maneiras de ação política na rede (POSTILL & PINK, 2012).
Essa mania de ser otimista: reflexões sobre segredo e exposição na não resposta do campo virtual de grupos do Facebook.
Autoria: Camilla Iumatti Freitas
Autoria: Cada vez mais as mídias sociais têm sido utilizadas para a criação de redes de ajuda mútua e compartilhamento de assuntos “íntimos”, como é o caso da infertilidade. Este work tem como objetivo entender como diante da ausência involuntária de filhos e o compartilhamento dessa situação nas redes sociais fazem emergir questões em torno do segredo e compartilhamento, especialmente em grupos no Facebook. Meu foco são as narrativas de mulheres em condições impeditivas de terem filhos. Falar de segredo e compartilhamento parece estar permeado por uma linha tênue entre exposição e resguardo de intimidades, situação que parece informar padrões de gênero e noções de parentesco socialmente construídas. Discutirei as dificuldades de inserção no campo pretendido, tomando a etnografia virtual como escolha metodológica para a pesquisa, a construção do desejo por filhos, intimidade e exposição em redes sociais, localizados, a partir de uma orientação teórico-metodológica dos estudos feministas. Especialmente, dialogo com o que Donna Haraway (1995) chamou por “sistemas de percepção ativos” para tentar entender como essas mulheres criam suas próprias traduções e modelos específicos de vida a partir de suas perspectivas.
Extrapolando fronteiras: como as Redes Sociais tem contribuído para um reelaboração da visibilidade e representatividade dos jovens da periferia de Natal/RN.
Autoria: Michael Guedes da Silva
Autoria: Em pesquisa de Mestrado em curso, tenho promovido o acompanhamento etnográfico de manifestação artística de rua baseada em valores e práticas da cultura Hip-Hop. Referida iniciativa, realizada na Zona Norte (região periférica) de Natal/RN, reúne uma crescente quantidade de jovens em torno dessa cultura urbana, centrando-se na prática dos duelos de MC’s. A Batalha do Vinho utiliza intensamente as novas tecnologias de informação e comunicação, valendo-se delas, sobretudo, na divulgação dos eventos que realiza. Todavia, a partir de uma observação mais detida, é possível constatar usos e significados subjacentes às intenções postas em primeiro plano. O grupo de jovens abordado é caracterizado fortemente por sua condição socioeconômica, típica das periferias das capitais brasileiras. Nessa condição, se espere (inclusive eles próprios), diante da segregação do espaço urbano, um isolamento não apenas físico, mas também subjetivos desses indivíduos. Contudo, o manejo das redes sociais tem sido fundamental para possibilitar a constituição de outras relações de sociabilidade, relações que extrapolam, em muito, os limites dos bairros periféricos. A partir da difusão em rede de suas manifestações artísticas, os jovens da Batalha do Vinho têm estabelecido vínculos de amizades com pessoas de condições socioeconômicas diversas da sua, bem como de outras regiões da cidade de Natal, de outros Estados do nordeste e do restante do país. Os novos vínculos de sociabilidade se fazem acompanhar de uma inédita compreensão de si frente ao outro e ao mundo. Jovens que, há pouco tempo, viam-se inferiorizados, ao se constatarem, agora, admirados por pessoas distantes dele em várias concepções, passam a constituir outra valoração de si enquanto sujeito. No âmbito desse movimento, a trajetória de vida de um jovem em especial tem reclamado espaço em minha pesquisa. Ao longo de sua adolescência e início de sua vida adulta, esse jovem tem mediado suas diversas relações de sociabilidade pelas Redes Sociais, em especial pelo Facebook. Dessa maneira, tenho constatado sinais de reformulação de sua identidade, em grande medida decorrente de suas interações online – como ele construiu, desde a rede de sociabilidade que integrava na infância (o movimento escoteiro) até outras redes atinentes a movimentos culturais e políticos, cada vez com maior autonomia e protagonismo.
Influenciadoras digitais crespas e cacheadas: plataformas online, mercado e produção de subjetividades
Autoria: Marcella Uceda Betti
Autoria: Atualmente observa-se um grande investimento do mercado de beleza em novas técnicas e produtos especificamente dirigidos aos cabelos crespos e cacheados e a proliferação, especialmente em plataformas online como o Facebook, o Youtube e o Instagram, de discursos que valorizam estes tipos de cabelos. Para muitas mulheres crespas e cacheadas, parar de alisar os fios e aderir ao cabelo natural é um ato de empoderamento, visto como atitude feminista e questão de autoestima, relacionada ao controle sobre o próprio corpo e à contestação dos padrões de beleza vigentes. Para as interlocutoras negras, a adesão ao cabelo natural também pode significar uma “volta às raízes”, não só porque a raiz crespa ou cacheada começa a aparecer quando se interrompe o alisamento, mas porque isto remete ao cultivo de uma ancestralidade africana, de uma conexão com seus antepassados. Este é o recorte empírico de minha pesquisa de doutorado, cujo objetivo geral é, partindo de uma abordagem interseccional, investigar os processos de subjetivação e produção de identidades relacionados a gênero, raça, política e estética. O contexto pesquisado emerge de uma complexa, e por vezes tensa, articulação entre mercado, ativismo e consumidoras. O work de campo tem se concentrado na etnografia de espaços online – canais do Youtube, grupos e páginas do Facebook e perfis do Instagram – e offline – feiras e eventos do mercado da beleza. A pesquisa de campo têm me levado a refletir sobre o modo como marcas de cosméticos, profissionais do mercado da beleza, influenciadoras digitais crespas e cacheadas, consumidoras e ativistas pelo cabelo natural mobilizam e (re)produzem ideias como representatividade, empoderamento e autoestima. Aqui os espaços online mostram-se fundamentais, pois por meio das redes sociais possibilitam uma ampliação do debate público, da atuação política, da proliferação de estilos e estéticas e de iniciativas de mercado voltadas para públicos específicos, especialmente no que concerne à produção de identidades e subjetividades. Nesta proposta, discutirei tais questões a partir da etnografia de dois canais do Youtube produzidos por influenciadoras digitais crespas e cacheadas: o de Gleici Duarte, que leva seu nome, e o de Gabriela Oliveira, intitulado DePretas. Gabriela, carioca e moradora de São Paulo, é negra e crespa, e utiliza seu cabelo ao natural ou com tranças, enquanto Gleici, de Brasília, é branca e tem longos cabelos cacheados tingidos de ruivo. A partir da construção de uma relação de proximidade com suas seguidoras e da parceria com marcas de cosméticos, as duas influenciadoras produzem conteúdos relacionados a cabelos, maquiagem, vida pessoal e também relacionados a feminismo e racismo, mobilizando ideias como representatividade, empoderamento e autoestima.
Narrativas compartilhadas: o Facebook e a produção de militâncias, memória e esquecimento nos movimentos sociais populares
Autoria: Patrícia Lânes Araujo de Souza
Autoria: A presente comunicação analisa a relação entre redes sociais virtuais (em especial o Facebook) e a produção da memória coletiva por movimentos sociais. A análise parte de etnografia realizada entre 2012 e 2018 junto a ações locais do conjunto de favelas que compõe o Complexo do Alemão (zona norte, Rio de Janeiro) que têm na produção audiovisual e no uso da Internet modos prioritários de ação. No contexto pesquisado, a produção da memória coletiva compreende diversas estratégias (entre elas, a produção de videodocumentários, livros, fotografias, grafites e intervenções urbanas e a criação de um centro de documentação e memória). Tais estratégias vem sendo pensadas pelos atores locais como formas de visibilidade pública da favela, modos de narrar o lugar, sua história e suas “lutas” a partir do ponto de vista de quem lá vive, mas também como maneiras de garantir que certas versões da história do lugar sejam conhecidas e transmitidas (em detrimento de outras). Ainda que a produção da memória coletiva seja recorrente em movimentos sociais populares, com a inclusão da Internet e suas plataformas em seus repertórios, a maneira pela qual se dá tal produção vem se alterando. Tais transformações vinculam-se a características das plataformas utilizadas combinadas aos agenciamentos de diferentes atores sobre tais recursos. Trata-se, portanto, de pensar de que maneira tais combinações modificam a relação com passado e presente, bem como as formas de conceberem sua relação com o tempo e com o lugar. Nesse sentido, é importante pensar como se articulam “memória do presente” (DALMASO, 2015) criada pelo constante compartilhar de fatos cotidianos à “memória social” (HALBWACHS, 1997) do lugar, que ancora pertencimentos e identidades (POLLAK, 1989, 1992). De que forma recursos disponíveis no Facebook - como álbuns de fotografia, a lógica da linha do tempo (“timeline”), marcação de pessoas e, mais recentemente, a possibilidade de rememorar posts antigos - contribuem para criar outras modalidades de produção da memória coletiva? E, ainda, como se articulam “memórias autobiográficas” (WANG, BROCKMEIER, 2002; CARNEIRO, GERMANO, 2017) constituídas nas redes sociais virtuais e memória coletiva em contextos em que falar de si possui valores contrastantes (a centralidade do “eu” nas redes sociais virtuais versus o controle permanente para que o indivíduo não seja mais visível do que a coletividade e/ou, no caso em questão, o lugar, a favela)? Não se trata de pensar a Internet e as redes sociais simplesmente como arquivos ou depósitos de rastros do cotidiano, mas de refletir sobre as implicações de seus usos na produção da memória coletiva, focando a interseção entre “memória do presente”, “memória autobiográfica” e “memória mediada” (DIJCK, 2007).
Notas de campo: a maquiagem como construção de um rosto
Autoria: Márcia Mesquita
Autoria: Este artigo pretende apresentar reflexões acerca de questões teóricas e metodológicas surgidas no work de campo realizado para meu doutoramento em Antropologia acerca do uso de maquiagem por pessoas que se dizem consumidoras e usuárias cativas desses produtos. Nele, trago discussões que serão temas de dois capítulos da tese em construção, sobre meu percurso no work de campo e sobre a centralidade do rosto e sua relação com as plataformas digitais, em especial o Facebook e Instagram. Primeiramente, o artigo traz estratégias que adotei para acompanhar no campo tais atores em suas ações, cujas particularidades tanto do fenômeno da maquiagem como das agências dos meios digitais demandaram uma observação multi-situada. Para realizar a pesquisa, acompanhei tais consumidoras tanto em ambientes digitais, como dois grupos de Facebook. Nestes grupos, são compartilhadas informações sobre técnicas de maquiagem elaboradas e uma grande variedade de produtos são apresentados e adotados por estas usuárias. No entanto, o fato de relatos das interlocutoras falarem sobre a apresentação de si com a maquiagem não apenas nas redes, mas também “ao vivo”, foi necessário acompanhar este tipo de consumidora em ambientes off-line, como cursos de auto maquiagem e eventos dedicados ao tema. Em seguida, apresento como questões relacionadas às ferramentas de plataformas digitais como Instagram estão contribuindo para o surgimento de padrões estéticos e na centralidade da exposição do rosto. A maquiagem se relaciona com este grupo como técnica manual para expressão e construção de rostos e identidades, em especial no que tange à identidade de gênero. Ao criarem estratégias de esconder e revelar utilizando os produtos da maquiagem, constroem seus rostos de acordo com padrões de beleza dominantes ou performando outros padrões em formas de se pintar desviantes, onde em alguns casos os efeitos produzidos por “filtros” do Instagram se tornam o padrão estético almejado, não apenas para fotos compartilhadas no online, mas na apresentação de si offline também.
O Direito de sonhar acordado e a imaginação da matéria
Autoria: Laura Graziela F. de F. Gomes
Autoria: Nos tempos atuais, o interesse pelos mundos paralelos encontra sua melhor expressão nos ambientes imersivos online, cuja popularidade recai mais sobre os jogos eletrônicos do que sobre os mundos virtuais. Esses ambientes apresentam visualidades muito distintas, cada uma remetendo a imaginários específicos que podem ter suas origens tanto em obras literárias, históricas, ou ainda no universo imagético e onírico de cineastas e artistas plásticos, quanto nas influências da cultura de massas, como a publicidade, cartoons, animações e HQs. O presente work pretende discutir as visualidades/paisagens no Second Life, um dos mundos virtuais mais populares e conhecidos, que acaba de completar 15 anos de existência e que durante todo este tempo foi totalmente construído por seus residentes. Neste particular, a proposta é reiterar os processos criativos e as competências sócio-técnicas envolvidas e necessárias para a criação dos cenários, das paisagens, dos objetos que as compõem, tais como acidentes geográficos, flora e fauna, sobretudo discutir as representações sobre a matéria: água, terra, fogo, ar e outras condições físicas e ambientais. Em resumo, o interesse recai sobre a criação da "física" deste mundo, bem como da agência exercida por ela sobre os residentes. O work é inspirado na obra de Gaston Bachelard.
O Jogo da Baleia Azul: Fake News, Lenda Urbana ou Pânico Moral?
Autoria: Francis Moraes de Almeida
Autoria: A preocupação de que jovens possam ser influenciados a condutas negativas é uma constante nos Estados Unidos: nos anos 30 foram os filmes de gangster, nos 50 os quadrinhos de horror, nos anos 80 os role-playing games (RPGs) são acusados de influência satanista e alto risco à saúde mental e nos 90 os jogos eletrônicos de tiro em primeira pessoa são vistos como incitação à prática de assassinatos em massa. Embora se originem no contexto norte-americano, tais preocupações se expandem além dele, sobretudo através de rumores e das chamadas lendas urbanas: histórias apócrifas que circulam por fax, posteriormente correntes de e-mails e hoje em dia por meio de mensagens de Whatsapp, advertem contra ameaças insuspeitas e pedem para que o aviso seja compartilhado. O presente work busca compreender o chamado “Jogo da Baleia Azul” (Blue Whale Challenge), que ocupou um amplo espaço tanto nas mídias tradicionais quanto nas redes sociais em abril de 2017 (especialmente no Brasil e na India). Embora ele apresente todas as características das chamadas fake news, a associação de casos de suicídio e de vítimas e a prisão dos chamados curadores do jogo no Brasil lhe conferem características distintas das lendas urbanas de outrora, por outro lado a intensidade e relativa brevidade do pico da preocupação com o fenômeno o aproximem muito do que se poderia classificar como um pânico moral. A partir da construção de um corpus de pesquisa tomando postagens de amplo alcance na rede social Facebook, matérias jornalísticas, artigos científicos publicados sobre o tema e sites que reúnem postagens de Whatsapp sobre o tema (efarsas e boatos.org) procura-se compreender este fenômeno em sua especificidade, tomando como referência as categorias analíticas de lenda urbana e pânico moral, bem como a designação “fake news”. Evitando-se cair na questão simplificadora de responder de antemão se o Jogo da Baleia Azul existe ou não, busca-se compreender a partir dos efeitos que ele produz em diferentes âmbitos. Palavras-Chave: lenda urbana, pânico moral, Jogo da Baleia Azul.
Ontologias feministas no ciberespaço: discursos e contra discursos “radfem”.
Autoria: Fabiana Jordão Martinez
Autoria: Este paper é fruto de uma pesquisa iniciada em 2016 que busca compreender o panorama do feminismo no ambiente web, atualmente, locus de construção de uma nova epistemologia do conhecimento feminista. Para isso, foi realizado um mapeamento relacionando grupos de discussão do Facebook a páginas da internet donde se produziu uma tipologia das “vertentes feministas” (e suas respectivas abordagens tematicas). Também atentou-se para a dinamica de movimentação que foi das “redes sociais às ruas”, isto é, o conjunto de discursos e manifestações que eclodiram em 2015 e que foi tratado pela mídia tradicional como a “Primavera Feminista”. Neste work, a proposta é dar sequencia a esta analise, tratando mais pontualmente do conteúdo disseminado por estes “feminismos do ciberespaço”, mais propriamente na rede social Facebook. Atentaremos principalmente para a presença de uma linha discursivo epistemologica que tem pautado em grande parte o debate feminista no ambiente web. Trata-se do “radfem”, um campo supostamente guiado pelas teorias do feminismo radical que veem no patriarcado a causa da opressão às mulheres, enfatizando questões como socialização feminina, exploração e apropriação sexual e pelo sistema capitalista. Por outro lado, é importante que se atente para a contrapartida destes discursos, um campo que de forma relacional e antinômica tem sido guiado pela epistemologia queer e pelo transfeminismo que insistem no poder da linguagem como vetor na construção de sexo e gênero. Os dados foram coletados utilizando software Nvivo, e incluem posts da rede social Facebook de: 1.agentes consagrados como formadores de opinião; 2. grupos de discussão e páginas que se autoproclamam alinhadas ao feminismo radical. Tem sido constatado que neste campo discursivo de ação o conhecimento feminista se constitui atra vés de classificações entre vertentes (no Facebook, em blogs e videos do Youtube) que perfazem uma espécie de “lógica totêmica feminista”, bem segmentada em “feminismos” (liberal, interseccional, marxista, queer e radical), que competem entre si, como um aspecto fundamental desta nova epistemologia do conhecimento feminista, um importante significante politico a espelhar o jogo das identidades na contemporaneidade. Parte destas disputas se dão em torno da categoria mulher e na busca por uma compreensao explicativa das ontologias de gênero. Forjada no bojo da articulação entre o conhecimento feminista academico formal, praticas, vivências e experiências cotidianas, esta nova “epistemologia feminista” requer novas abordagens teóricas e instrumentos metodológicos capazes de resolver a dissolução de antigas formas temporais (que obedeciam a um sincronismo entre passado, presente e futuro) e o caráter multissituado e fractal deste processo.
Por que se odeia tanto na internet? Conflitos sociais e emoções à flor da pele nas interações mediadas
Autoria: Eliane Tânia Martins de Freitas
Autoria: Desde a reflexão desenvolvida por Georg Simmel acerca da noção de conflito social, sabemos que este pode ser instaurador de formas de relações sociais e não apenas algo disruptivo e “perigoso” para a continuidade da vida social. O sucesso das plataformas do tipo “rede social” (Facebook, Twitter etc.) tem sido acompanhado pela proliferação de inúmeras modalidades, senão inéditas, ao menos singulares de agressões e conflitos, que vêm recebendo por parte da grande mídia e nas próprias novas mídias online, denominações que se baseiam em classificações que vão sendo, aos poucos, formuladas por diferentes agentes sociais e revelam interpretações heterogêneas e nada consensuais sobre esses conflitos. O único aparente consenso é a ideia, disseminada, de que as redes estariam de algum modo contribuindo para a disseminação de discursos de ódio e uma multiplicidade de agentes promotores desses discursos. Nesta apresentação procuro refletir sobre contextos recentes nos quais conflitos classificados nessas mídias – e por elas – como “linchamentos” de figuras públicas e promoção de ódio colocaram em cheque as próprias redes e qual seria, então, a representação feita da comunicação online, da responsabilidade dos seus agentes em termos morais e das próprias noções de ‘ódio’ e outras correlatas, como ‘assédio’ e ‘linchamento’, nesses contextos. Nesse sentido, pensar sobre conflitos nas redes no contexto da comunicação mediada é pensar nas relações que as pessoas estabelecem consigo e com os outros, na interação online, em termos de códigos que fundamentariam suas condutas e também em termos da compreensão (antropológica) das suas emoções.
“Não me Kahlo”: Uma netnografia acerca do ciberativismo feminista na rede social Facebook
Autoria: Teonila Thais Santos Valente de Oliveira
Autoria: Este estudo analisa o ciberativismo feminista presente na página “Não me Kahlo” na rede social Facebook no dia 8 de março de 2017. A metodologia empregada consistiu no método netnográfico, uma forma especializada de etnografia, mas que utiliza comunicações mediadas por NTICs como fonte de dados. A análise se deu através das publicações que a página compartilhou, considerando a quantidade de reações que ela obteve, apresentando também a quantidade de comentários recebidos, assim como o conteúdo dos comentários de maior relevância. A partir da pesquisa foi possível observar o grande engajamento com causa feminista em que a página atua, passando a ser uma potente ferramenta política, para propagar o movimento feminista, assim como um palco de luta contra o machismo.
“Tour pelo meu corpo”: narrativas de mulheres com deficiência no YouTube
Autoria: Fernanda Cristina Ferreira Nunes
Autoria: Este work é parte da pesquisa de doutorado, em andamento, intitulada “Empoderar é conhecer o seu poder”: estética e potência nas narrativas de mulheres com deficiência no YouTube. A investigação engloba os campos dos Estudos sobre Deficiência e das Humanidades Digitais, endossando as discussões sobre etnografia online e a compreensão da internet como nova possibilidade analítica. O objetivo mais amplo é compreender as dinâmicas envolvidas no “empoderamento” virtual, por mulheres com deficiência, no YouTube. Neste recorte, destacam-se as noções de corpo representadas verbal e visualmente. A metodologia da pesquisa envolve a análise etnográfica dos conteúdos disponíveis em dois canais, no YouTube, que focalizam um viés não-biomédico de narrativa da deficiência. O primeiro se chama “Vai uma mãozinha aí?”, produzido por Mariana Torquato, que nasceu com agenesia de membro. Em 2018, este canal alcançou a marca de 100.000 usuários inscritos, sendo “Tour pelo meu corpo” um dos vídeos com maior número de visualizações. O segundo é realizado pela transexual cadeirante Leandrinha Du Art, nascida com uma síndrome genética rara. Em 2017, ambos os canais conquistaram projeção midiática nacional e participaram de eventos de grande porte, além de programas televisivos e matérias de jornais e revistas. A internet e o YouTube, em especial, vêm se mostrando como ferramenta de comunicação e de visibilidade social por excelência. Hoje, o Brasil ocupa o segundo lugar no ranking de usuários do YouTube, atrás apenas dos Estados Unidos. Não é novidade que a popularização da internet, em meados da década de 1990, trouxe consigo outras formas dos indivíduos se relacionarem e experimentarem a própria condição. O fato é que tecnologias digitais promovem efeitos na vida social e econômica das pessoas. Para além de representar um espaço que facilita a comunicação, é um nicho mercadológico, que profissionaliza “influenciadores digitais” e monetiza a “intimidade pública”. Em comum, os canais abordados na pesquisa discutem gênero, corpo e sexualidade, sob a perspectiva do que denominam como “empoderamento” (categoria êmica). No YouTube, há uma variedade de canais sobre os mais diferentes assuntos. Chama a atenção o fato dos conteúdos estudados se desvincularem de perspectivas religiosas ou baseadas na comoção ou no argumento da “superação” (tragédia pessoal). Resultados parciais da pesquisa também indicam que, apesar de compartilharem o foco na aceitação do corpo deficiente, os canais “Vai uma mãozinha aí?” e “Leandrinha Du Art” se afastam quanto às dinâmicas de narrativas. Se, por um lado, a deficiência física é explorada de forma “irônica e bem-humorada” a partir do movimento "body positive”, por outro, é locus de militância partidária e política.
“Vamos Sair do Bolo com a Nave Ace” – Notas Etnográficas sobre Visibilidade Política da e na Assexualidade no Ciberespaço
Autoria: Giórgia de Aquino Neiva
Autoria: Há grupos de pessoas, cada vez mais expressivos e numerosos no ciberespaço, que se autoidentificam como assexuais (categoria êmica para se referir à orientação sexual chamada assexualidade e que significa, em linhas gerais, pessoas que não tem interesse de praticar relações sexuais com outrem) e se organizam na internet em fóruns, blogues e mídias sociais com o propósito de construírem conhecimentos sobre assexualidade, adquirirem visibilidade política e conquistarem despatologização do termo nas áreas médicas, pois a falta de interesse sexual os colocam automaticamente na lista dos distúrbios sexuais, de acordo com a bibliografia especializada da assexualidade no que se à medicina – que confere anormalidade ao tema, especialmente porque se baseia em padronizações hegemônicas. A patologização sexual serve para impor um modelo único de vida, hegemônico e heterossexual, acarretando consequências sociais para quem não se enquadra nesse modelo, uma vez que os corpos sexuais e assexuais estão inseridos em processos históricos de classificação, intervenção e significação. Dessa forma, o objetivo desse work é refletir uma das questões que desenvolvo no curso de Doutorado em minha pesquisa sobre movimento político da e na assexualidade em ciberespaços. A internet é o grande palco no que se refere à política de visibilidade entre assexuais, posto que desde o início dos anos 2000 com a criação da Rede de Visibilidade e Educação sobre Assexualidade (AVEN - Asexuality Visibility and Education Network), nos Estados Unidos, outros fóruns foram abertos para a fomentação do debate e as dinâmicas políticas e identitárias dessa orientação sexual. No entanto, o fato das pessoas assexuais se organizarem em grupos via internet, especialmente por causa da facilidade em unir, reunir e debater ideias em comum, programar encontros presenciais, encontrar pares, desabafar anonimamente, adquirir e produzir conhecimentos, não determina que a identidade seja vivida apenas no virtual. Por isso mesmo que o campo internético tem sido fortuito para essas “saídas do bolo”. “Sair do bolo”, dessa maneira, é um termo cotidiano entre interlocutores e interlocutoras que mantive contato constante e está intimamente ligado ao termo sair do armário, tão bem dissertado por Sedgwick (2007) em A Epistemologia do Armário. Sendo assim, as questões que coloco para essa reflexão são: esse movimento social tem conseguido ressignificar o sentido de patologização dado pelas áreas médicas com o ativismo realizado no ciberespaço? Como acontece esse ativismo no ciberespaço? E, por fim, como é agenciado por eles e elas a “saída do bolo” em espaços online e offline?