Cinque Terre
GT 025. Cidades, turismo e experiências urbanas
Juliana Gonzaga Jayme (PUC Minas) - Coordenador/a, Lea Carvalho Rodrigues (Universidade Federal do Ceará) - Coordenador/a, Wânia Maria de Araújo (Universidade do Estado de Minas Gerais e Centro Universitário Una) - Debatedor/a, Vera Maria Guimarães (UNIPAMPA) - Debatedor/a, Maristela Oliveira de Andrade (Universidade Federal da Paraíba) - Debatedor/a)
Desde a 29ª RBA, coordenamos um GT, cuja proposta é contribuir para as discussões no âmbito da antropologia urbana e do turismo. Assistimos, de um lado, às políticas urbanas comuns nas metrópoles, em especial em suas áreas centrais e pericentrais, voltadas para as chamadas requalificações que, muitas vezes, vão ao encontro da ideia de marketing urbano, com intervenções em edifícios históricos, que se tornam lugares de entretenimento e consumo cultural. A memória é usada estrategicamente, valorizando o passado como mercadoria cultural, de modo que se frua história e cultura nesses lugares. Ademais, o turismo é uma activity que pode impactar cidades de quaisquer portes, com efeitos na reconfiguração de espaços e na criação de lugares e paisagens. As cidades são, a um só tempo, lugares identitários (Augé) e de memória (Nora); espaços de dispersão, fragmentação e fluxos (Hannerz); espaços de encontro e de conflito. As cidades turísticas, por outro lado, à parte suas singularidades, necessitam criar atrativos ao visitante, despertar seu interesse e suscitar desejos de ali estar, ver e viver experiências ímpares, distantes do cotidiano, o que cria um imaginário sobre elas via narrativas dos moradores, viajantes e empresas de turismo. Este GT acolherá propostas que resultem de pesquisas empíricas sobre essas temáticas e promovam articulações entre problemas teórico/metodológicos, próprios aos dois campos disciplinares, ou enfoquem diferentes dimensões analíticas sobre os temas
Resumos submetidos
A Reserva Pataxó da Jaqueira: Etnoturismo, Autogestão e Protagonismo Feminino em uma Terra Indígena na “Costa do Descobrimento” (Porto Seguro – Bahia - Brasil).
Autoria: Rodrigo Pádua Rodrigues Chaves
Autoria: Apresento parte dos resultados da etnografia do turismo realizada na Terra Indígena Coroa Vermelha, de ocupação da etnia Pataxó, localizada nos municípios de Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália - Bahia - Brasil, contextualizando-a no âmbito do desenvolvimento e no crescente interesse no denominado turismo étnico nos últimos anos em todo o mundo, assim como nas discussões levantadas por antropólogos, geógrafos e cientistas sociais que desenvolvam pesquisas sobre turismo cultural e étnico em comunidades indígenas. Relaciono a experiência dos índios Pataxó com atividades turísticas não só com os demais segmentos da população regional, mas, também, com uma sorte de outros segmentos multilocalizados, contextualizando a pesquisa nas discussões ensejadas no âmbito da antropologia do turismo, buscando dialogar com a literatura antropológica brasileira e internacional. Minha tese é que o work realizado pelos indígenas Pataxó na Reserva da Jaqueira engendrou um processo de valorização cultural e “resgate” da língua Patxohã, bem como serviu como “modelo” para outras comunidades indígenas brasileiras.
A rua fechada e os diferentes usos do espaço público urbano.
Autoria: Gláucia Maria de Jesus Lima, Natália Amado
Autoria: O objetivo desse estudo é analisar, através da observação da dinâmica socioespacial da “rua fechada”, os diferentes usos do espaço público urbano. A “rua fechada” ou simplesmente “RF” é um projeto realizado pela prefeitura do município de Maceió em Alagoas, o qual aos domingos o trânsito de um trecho da avenida da praia da ponta verde é fechado e esse espaço passa a ser usado para o lazer. A “rua fechada” enquanto espaço público atrai diversas pessoas por ser um lugar onde as mesmas podem transitar livremente, fazer reuniões ao ar livre, levar crianças ao parque que nela é montado, além de possibilitar uma série de atividades, como patinação, ciclismo, corrida, entre outras. Dessa forma, o público que frequenta a “rua fechada” é bastante diverso, sendo verificada a presença de grupos sociais distintos, além dessa variedade também se dar com relação à faixa etária e ao poder aquisitivo, fazendo dela um espaço, considerado pelos seus frequentadores, como democrático. Para tanto foi utilizado o método etnográfico, através da observação direta, a partir de conversas com frequentadores da “rua fechada”, o qual possibilitou melhor compreensão da configuração desse espaço público urbano que passa por transformações e/ ou ressignificações, de como são tecidas as relações sociais sendo caracterizadas pelas individualidades típicas do urbanismo. E ainda, que apesar de ser considerada um espaço democrático há, na rua fechada, fatores externos que a qualificam e hierarquizam, favorecendo o surgimento de "enclaves sociais”.
A(s) Feira(s) Central de Campo Grande
Autoria: Juliana Barbosa Lima e Santos Toyama
Autoria: No ano de 2004, a Feira Livre Central de Campo Grande (MS) deixou de ser feita numa rua da cidade e desde então ocupa uma edificação implantada na Esplanada Ferroviária e renomeada como Feira Central e Turística. A edificação se trata de uma estrutura modular, com corredores ajardinados protegidos por uma cobertura feita em tenso-estrutura e possui elementos estéticos que remontam o estilo Shinden - arquitetura que era utilizada em épocas de Japão feudal, justificada sob a homenagem aos comerciantes de ascendência japonesa da feira. Se outrora a feira era um espaço misto e integrado de comércio, agora, protegida por grades e equipamentos de segurança particulares, ela é dividida em dois blocos principais: um destinado à gastronomia e outro, destinado ao comércio varejista. Este work procura refletir sobre os significados e contextos de sua transformação em cenário turístico, bem como a memória em torno da antiga Feira Livre Central. Nessa linha de raciocínio conseguimos observar existem sentidos diacrônicos nas dimensões do tempo, do espaço e da cultura. Compreender o tempo e o espaço como categorias tão importantes como a cultura para pensar a feira nos leva a perceber que a Feira Central, como a cidade, é um processo, e não um patrimônio cristalizado. Notamos assim que, também a Feira, como a cidade, não é apenas uma, mas várias: se por um lado ela é uma intervenção urbana, ela também é uma memória; se ela é a feira “dos japoneses”, ela também é a feira dos artesãos; se ela é a feira do consumo, ela também é uma feira do trabalhador; se é uma feira para o turista, ela também é uma feira para o cidadão de Campo Grande; se ela é uma feira de distinção, ela também é uma feira de similaridades. Logo, decidimos organizar nesse work os olhares sobre este espaço e analisar as diferentes visões desse lugar simbólico e heterogêneo, bem como, buscar através das diferentes perspectivas que compõe esse lugar, o ângulo pelo qual discussões se encontram e geram significados.
Afro-patrimônios na cidade: “lugares de memória” como atrativo turístico?
Autoria: Mariana Ramos de Morais
Autoria: Os estudos sobre a relação entre patrimônio cultural e cidade tem privilegiado as regiões centrais das metrópoles. Muitos deles abordam os projetos de intervenção/requalificação urbana; a transformação do patrimônio em mercadoria como um diferencial no chamado “mercado global de cidades” e também na indústria do turismo; e o papel da patrimonialização nos processos de gentrification/enobrecimento. Nesta comunicação, no entanto, o foco está na periferia das grandes cidades, onde majoritariamente estão situados os afro-patrimônios, como se observa no caso dos reinados de Nossa Senhora do Rosário situados em Belo Horizonte e nas cidades do seu entorno metropolitano. O processo de patrimonialização da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário do Jatobá, na capital mineira, será, assim, descrito e analisado. Tombada em 1995 pelo município, essa Irmandade está localizada no bairro Itaipu, distante fisicamente da área central da cidade. Ela foi escolhida para representar um “marco da resistência negra” em Belo Horizonte, durante as celebrações locais em homenagem aos 300 anos da morte de Zumbi dos Palmares. Seria, dessa forma, nos termos de Pierre Nora, um “lugar de memória”, da memória dos negros. Porém, após o ato do tombamento não foram registradas ações do poder público municipal em que essa Irmandade fosse mobilizada. É como se o bem patrimonializado estivesse encerrado nos livros de tombo, uma vez que não é partícipe do cotidiano da política pública. Por isso, lanço a questão: em que medida os afro-patrimônios, pensados como “lugares de memória”, seriam atrativos turísticos? O caso da Irmandade do Jatobá é a base para se refletir sobre essa questão, mas outros casos também serão mencionados – como o registro do Cais do Valongo, no Rio de Janeiro, como patrimônio mundial pela Unesco e a patrimonialização de terreiros (candomblé, tambor de mina, culto a egungun) no âmbito do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Intenta-se, a partir desses exemplos, demonstrar como a questão proposta pode suscitar diferentes apontamentos. Além disso, busca-se colocar em evidência as disputas, as contradições e as ambiguidades presentes na constituição dos afro-patrimônios.
Antropologia do Espaço e Os Espaços Urbanos Festivos – Tecendo Movimentos e Práticas na Cidade
Autoria: Gustavo Fiorini Marques
Autoria: Em um mundo em que os atravessamentos e práticas culturais acontecem intensamente em uma localidade específica, o espaço passa a ser uma abordagem necessária para se pensar acontecimentos da vida urbana, enquanto característica que está sempre colocando em relação coisas e fundamentando a ambientação das disposições e composições dos fatos e fenômenos culturais. Trata-se, nesta pesquisa, sobre como a cidade opera dentro da perspectiva de sujeito e palco de interações sociais densas nos espaços públicos, dispostas e emaranhadas em uma constância de âmbito político, de ação política e habitação da cidade. Se por um lado é a partir da relação que se compreende um acontecimento, então é por meio da apreensão de ideias operando em determinados espaços, que se poderá absorver as constâncias e inconstâncias dos lugares. As práticas festivas transitam justamente na possibilidade de apreender a cidade, na construção e desconstrução dos diferentes modos de habitar, dessas práticas mesmo, criativas e sensitivas. Nessa perspectiva, a Antropologia do Espaço tem muito a contribuir para essa compreensão. São vários os coletivos urbanos que têm produzido festas e ocupações que pretendem reunir ideias e consequentemente fundar outras formas de habitar a cidade. Essas práticas de ocupação fundamentam-se na crença política de grupos sociais urbanos que praticam novas possibilidades de entretenimento, de movimentação em espaços explicitamente citadinos, em que a trança de elementos sonoros, visuais e sociabilizações ocorrem densamente, não mais somente em boates, pubs e outros lugares privados. Sendo assim, a ideia nessa pesquisa é tentar compreender a cidade através dessas particularidades contemporâneas da vida urbana, considerando necessário que se observe a partir do espaço enquanto elemento que, em certa medida, ordena e distribui essas feituras urbanas, mas que também é moldado e remodelado, construindo e desconstruindo a cidade e práticas muitas vezes consideradas como tradicionais. Partindo dessa ideia de “prática” e entendendo a cidade como sujeito, as questões passam a ser variadas. Os espaços festivos, do ponto de vista da prática e da transformação, não se limitam ao entretenimento, como também constitui um fenômeno, um fato cultural contínuo – ora, a cidade é tanto um emaranhado, como um desemaranhado. Assim, as festividades citadinas se intensificam em uma órbita que necessariamente compõe a experiência urbana, e, portanto, esses eventos, organizados por coletivos como o Arruaça, em Porto Alegre (RS), a 1010 e o Masterplano, em Belo Horizonte (MG), a Batekoo, em diversas cidades brasileiras, o Sofá na Rua, em Pelotas (RS), enfim, indicam para uma certa necessidade de estar em outros espaços, descobrir a cidade que nem sempre é vivida aqui, ali ou acolá.
CASULO – Escritório itinerante de arquitetura e design: uma etnografia sobre comportamento e identidade nas periferias de Campo Grande – MS
Autoria: Hugo Costa Gripa
Autoria: A casa é uma expressão, e também uma expansão do eu. Não é de hoje que o ser humano imprime sua marca nas suas escolhas de consumo e no seu jeito de morar. Estudar essas relações de consumo, além de simplicidades aparentes, é uma tarefa complexa. Em dados contextos é crucial identificar os valores que permeiam essas relações. Neste sentido, a presente pesquisa está centrada em uma investigação etnográfica em um escritório itinerante de arquitetura e design, que percorre periferias de Campo Grande – MS, a bordo de um motor home, oferecendo projetos de arquitetura mais acessíveis à população além centro. Esta pesquisa tem o propósito de entender de que modo as escolhas do morador da periferia são influenciadas e interagem na constituição de suas identidades e de paisagens das regiões periféricas por onde este escritório percorre. Campo Grande é uma capital nova e passa por intensos processos de modificação espacial nos últimos anos, como a potente expansão dos circuitos de consumo de bens materiais e simbólicos para uma população que, até então, teria que se deslocar para o centro da cidade. Assim, a pesquisa pretende etnografar atendimentos do referido escritório itinerante, conversando com clientes - moradores de bairros da periferia, observando suas relações e componentes de decisão e consumo, para depois analisar, a partir da Antropologia Social, especialmente da Antropologia Urbana, o que se refere à construção de cidades, competição social, comportamento humano no meio urbano, marcadores sociais de diferença e relações de poder em territórios determinados. O Casulo surgiu em Campo Grande a partir da percepção de sua proprietária na resistência de algumas pessoas em acessar um escritório central, talvez pelo “estigma” de que esse serviço seja inacessível. Neste sentido, a possibilidade de levar projetos de arquitetura a qualquer canto se torna instrumento para alcançar a periferia, considerado um novo centro de consumo. Casulo nada mais é do que um envoltório, uma capa protetora feita por insetos, onde sofrem a metamorfose, a mudança. Neste sentido, o referido motor home se propõe a espalhar transformação e aproximar a arquitetura das pessoas de toda cidade, fugindo do tradicional, desmistificando estigmas e contribuindo para transformação de perspectivas estéticas e valores simbólicos de moradores da periferia.
Cidades turísticas e conflitos socioambientais: Estudo etnográfico em Jericoacoara- Ceará.
Autoria: Helenita Maria Teixeira Marques Martins, Fabiana do Nascimento Pereira.
Autoria: Este work é o estudo etnográfico do conflito socioambiental que está ocorrendo na Vila de Jericoacoara, localizada a 18 quilômetros de Jijoca (município sede), litoral Oeste do estado do Ceará-Brasil. A vila encontra-se entre os limites do Parque Nacional de Jericoacoara (PARNA) e o mar, que a caracteriza semelhante a uma ilha; os acessos são por três rotas monitoradas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Em decorrência das mudanças ambientais, sociais, políticas e econômicas na localidade, estabeleceu-se um embate entre a preservação ambiental e o crescimento turístico do lugar com crescente especulação imobiliária. O interesse inicial surge a partir do estudo de Rodrigues (2015) que realiza a descrição sobre a configuração do Turismo em Jericoacoara e as disputas que circundam os usos e permissões dos espaços tanto da vila quanto do Parque e a proposta de parceria público privada (PPP), feita pelo ICMBio. A pesquisa que participamos, acompanha as negociações sobre a atual proposta de concessão de uso do parque à empresas privadas (proposta que substitui a PPP). Estas reuniões são realizadas pelo ICMBio com atores sociais que integram os grupos envolvidos: Governo do estado do Ceará, Prefeitura de Jijoca de Jericoacoara, Conselho comunitário de Jericoacoara, Associações de caminhoneteiros, Associação Eu Amo Jeri, trabalhadores informais e representantes de estabelecimentos de serviços e pousadas. A metodologia da pesquisa baseou-se nas proposições de Little (2006) para o estudo dos conflitos socioambientais, na área de estudos da Ecologia política. A proposta é relacionar aspectos sociais, naturais ou socioambientais, dando relevância ao contexto dos fluxos processuais dos acontecimentos na vila e a identificação de sua dinâmica interna. Essa metodologia tem nos permitido perceber os atores que estão nas disputas pela gestão e controle de usos e recursos que envolvem desde o trânsito pelo PARNA até a entrada na Vila, local de fluxo onde estão concentrados hotéis e pousadas para a permanência de turistas transformando-se em uma cidade turística. Uma recente medida municipal instituiu uma taxa de turismo Sustentável (TTS) por meio de decreto sancionado em setembro de 2017, desencadeando discussões sobre o uso do recurso arrecadado. Este work, que ainda se encontra em andamento, tem por objetivo, compartilhar experiências metodológicas e apresentar os dados coletados, em campo, e os acontecimentos envolvendo uma transformação urbana com consequências sociais, culturais, políticas e ambientais por meio de demanda do Turismo praticado em Jericoacoara.
Disputas e controvérsias sobre a apropriação do espaço público pelo turismo, no bairro Las Independencias, Comuna 13 de Medellín, Colômbia
Autoria: Luiz Alexandre Lellis Mees, Christian Giovanny Álvarez López Liliana Maria Sanchéz Mazo Luiz Alexandre Lellis Mees
Autoria: Desde 2004, até os dias de hoje, as políticas urbanas de Medellín-Colômbia, têm se destacado, até mesmo internacionalmente, como responsáveis por uma rápida “transformação urbana”, especialmente aquelas realizadas nos bairros populares. Um dos resultados desta transformação é o posicionamento da cidade como atrativo turístico, fortalecido por normas e a criação de novas entidades. A partir dessa premissa, a pesquisa busca analisar a incidência do turismo no cotidiano daqueles que moram no bairro Las Independencias, localizado na Comuna 13 de Medellín, a partir da apropriação social, econômica e cultural dos seus espaços públicos pelo turismo. Dentro desse processo, Las Independencias apresenta-se como um dos bairros mais impactados pela política urbana e, atualmente, recebe grande quantidade de turistas locais e estrangeiros que visitam a cidade. A pesquisa propõe indagar questões ligadas à apropriação social, econômica e cultural dos espaços públicos, geradas pelas práticas de turismo e pelos atores imersos neste fenômeno. Considera-se que as práticas de turismo neste bairro também colocam em jogo identidades e memórias locais, assim como disputas e controvérsias na apropriação do espaço público por diferentes atores sociais, gerando novas dinâmicas urbanas, a partir de sua configuração como atrativo turístico.
Etnografia a bordo: um olhar sob as relações socioculturais dos tripulantes e de passageiros numa experiência além-mar em um navio de cruzeiros
Autoria: Felipe Gadelha Rocha
Autoria: Este work visa por demonstrar um estudo efetuado dentro de um navio de cruzeiro, abordando a interação sociocultural manifestada pelos os que vivem por um tempo neste navio, os tripulantes e suas relações com os convidados, os passageiros. Este estudo teve a duração de sete meses dentro do Navio MSC Musica. Compreendendo as manifestações culturais desses moradores e seus aspectos cotidianos. Desde seu embarque até o desembarque. Bem como, entender as rotinas do navio nos trechos da temporada brasileira e na temporada pelo Mar Mediterrâneo. A relevância deste estudo se dá pela necessidade antropológica de pesquisar o “nosso desconhecido” e contribuindo assim por mais diversificação em estudos etnográficos.
Etnografia Remota e o Uso do Google Street View: Uma pesquisa na área da Farra Velha Imperatriz-MA.
Autoria: Ana Paula Pinto Pereira
Autoria: O presente artigo busca explorar a importância da ferramenta Google Street View no processo etnográfico. Logo, ele compõe uma reflexão que veio a partir de um projeto de pesquisa que tem por título “Histórias e Visualidades Urbanas do Ciclo do Arroz: Imagens e Memórias na área da Farra Velha”. A referente pesquisa objetiva analisar as relações de estigma na área da Farra Velha, caracterizar as composições sociais existentes no local e construir narrativas com base nos dramas cotidianos das famílias que lá habitam. Nesse sentido, a pesquisa tem uma base antropológica e histórica, pois visa trazer a tona não só as imagens do presente, mas também do passado. Para a realização da pesquisa supracitada, usamos como base teórica o pensamento de Eckert e Rocha (2011) sobre a Etnografia da Duração, que para as autoras, “destaca as intrigas , as diversidades de imagens e de dramas que configuram o cotidiano citadino, apreendidos como uma espécie de mapeamento simbólico do emaranhado dos ritmos vividos por seus habitantes em múltiplos territórios”. No decorrer da pesquisa etnográfica houve a necessidade de fazer uso de imagens do Google Street View como uma tentativa de compreender mais o objeto de estudo, para tanto, utilizou-se como base teórica o pensamento de Frúgoli Jr. e Chizzolini (2017) os quais abordam a relação entre etnografia face a face e etnografia virtual com base nas imagens do Google Street View e a sua pesquisa sobre os usuários de crack nas ruas do centro de São Paulo. Portanto, entende-se que as tecnologias atuais podem ser ferramentas importantes na compreensão do nosso objeto, como alargar o tempo de observação, ratificar a observação face-a-face, facilitar a observação de áreas em que o pesquisador possa ter dificuldade em adentrar pessoalmente, mapear a região virtualmente entre outros. A etnografia virtual permite voltar ao passado pelas imagens disponíveis do Google, por meio delas é possível fazer comparações às estruturas físicas do presente, ratificar fala dos nossos interlocutores entre outros. Portanto, o referido artigo aborda como as imagens disponíveis no Google foram importantes no processo de compreensão do nosso objeto de pesquisa.
Festas de Santos e Cidades: Alguns aspectos comparativos entre as Festas de Santo Antônio nas cidades de Duque de Caxias (RJ/Brasil) e Lisboa (Portugal)
Autoria: Renata de Almeida Oliveira, Regina Maria do Rego Monteiro de Abreu
Autoria: Este artigo é um recorte de minha Tese de Doutorado desenvolvido sob orientação da Profª Drª Regina Abreu no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Memória Social (PPGMS) da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Com ele pretendemos apresentar alguns resultados da Tese após pesquisa de campo realizada em Duque de Caxias nas Festas de Santo Antônio em 2014 e 2015 e nas Festas de Lisboa em 2016. Em virtude da atual situação do Brasil, infelizmente não foi possível fazer uma pesquisa de campo tão completa em Lisboa quanto a realizada em Duque de Caxias em virtude da suspensão das bolsas sanduíche na época. Assim, viajei para Portugal no mês de junho com recursos próprios para presenciar um pouco a festa e tentar traçar alguns aspectos comparativos. Apesar de pouco tempo, consegui acompanhar muitos traços das comemorações em Lisboa e diversos informantes que foram fundamentais para que eu pudesse conseguir obter alguns importantes resultados para essa pesquisa. A Festa de Santo Antônio é uma das comemorações mais emblemáticas das cidades de Duque de Caxias e Lisboa pela diversidade nela contida. Uma multiplicidade de crenças e culturas que se encontram mesmo que em seus motivos particulares. Em Duque de Caxias, apesar de ser uma comemoração que compõe o calendário oficial de comemorações no município, ainda existem muitas questões referentes à memória e patrimônio local que necessitam de amplo debate para que possam ser registrados. Em Lisboa a festa é importante por comemorar não apenas o Santo Antônio, mas também os santos de junho, bem como pela importância concedida ao Santo por ter nascido na cidade e por na Igreja de Santo Antônio de Lisboa estarem os relicários com partes de seus ossos, que levam milhares de peregrinos todos os anos ao Santuário. Não espero com este artigo ter resolvido todas as questões ligadas às festas, às cidades e aos conceitos aqui apontados, mas provocar uma discussão referente à importância das festas populares no espaço urbano e a representatividade que as festas de santos ainda possuem, sobretudo tratando-se do Brasil, que estatisticamente o quantitativo dos seguidores do catolicismo vêm caindo bruscamente.
INTERAÇÕES NOS ESPAÇOS COMERCIAIS: um estudo sobre sociabilidade no bairro Anchieta em Belo Horizonte
Autoria: Lívia Matos Lara de Assis
Autoria: Este work é inspirado em uma monografia de Ciências Sociais defendida no segundo semestre de 2017 na PUC-MG. Seu conceito central é o de Terceiro Lugar, desenvolvido por Ray Oldenburg. O objetivo é analisar, por meio de um estudo sobre sociabilidade em um bairro belo-horizontino, os desdobramentos e as relações desse conceito com outros semelhantes, como de sociabilidade pura de Simmel; a ideia de vida pública informal, de Jane Jacobs e a concepção de Goffman acerca da ordem social presente nas interações. Terceiro lugar designa uma variedade de espaços públicos que recebem encontros regulares, voluntários e informais, de indivíduos para além dos domínios da casa e do work. Nesse sentido, foram analisados, como terceiros lugares, espaços comerciais presentes no bairro Anchieta, na capital mineira, como forma de averiguar como ocorrem tais interações. De acordo com o desenvolvimento da pesquisa foi possível notar que a maioria dos estabelecimentos observados cujo caráter de sociabilidade pura estava presente e que influenciam um contato mais íntimo entre seus frequentadores, já está no bairro há décadas. Entretanto, um outro achado de grande relevância foi o fato de alguns dos estabelecimentos mais recentes do bairro também apresentarem tais tipos de interação, uma vez que se supôs que as interações mais íntimas seriam exclusivas do comércio mais antigo.
La Migración y los hermanos: o processo de migração de argentinos para a cidade de Armação dos Búzios (RJ)
Autoria: Alexandre de Oliveira Silva, Silva, Alexandre.
Autoria: A migração de argentinos em direção ao Brasil é um fenômeno conhecido mas, em relação às especificidades deste processo na cidade de Armação dos Búzios (RJ), poucas obras versam sobre o assunto. Este work apresenta as considerações iniciais a respeito do processo migratório e de estabelecimento de argentinos na cidade de Búzios e cria caminhos pelos quais pretendo direcionar a pesquisa. Nesta composição, aponto discussões acerca do conceito de identidade e me debruço sobre as primeiras concepções a respeito do campo, assim como busco compreender as peculiaridades deste processo migratório.
Memória, Patrimônio e Turismo: o caso do Cais do Valongo no recente processo de planejamento urbano do centro da cidade do Rio de Janeiro
Autoria: Maria Amália Silva Alves de Oliveira
Autoria: O processo de inscrição do Cais do Valongo (RJ), principal ponto de desembarque de africanos escravizados no Brasil, na lista do patrimônio mundial da humanidade revela um conjunto de questões que tem favorecido a reflexão de temas como políticas de planejamento urbano, regimes de patrimonialização em espaços urbanos, diáspora africana, construção de subjetividades, memórias traumáticas, entre outras. Em todas as discussões dessa natureza, quando atreladas ao caso do Sítio Arqueológico do Cais do Valongo, o turismo irrompe, ora como discurso de compartilhamento de uma memória que objetiva processar um traumatismo, ora como elemento memorial que rememora eventos trágicos e conflitivos ou ainda em discursos de mercantilização de memórias. Assim sendo, a proposta do presente work incide em uma reflexão sobre a reconfiguração da identidade da cidade do Rio de Janeiro considerando o processo de patrimonialização do Cais do Valongo e sua inclusão no projeto Rota dos Escravos, programa desenvolvido pela UNESCO e apoiado pela Organização Mundial do Turismo (OMT), através do “Circuito Histórico e Arqueológico da Celebração da Herança Africana”.
Monumentos e narrativas memoriais: um estudo comparativo entre duas cidades planejadas erguidas no século XX
Autoria: Jordanna Fonseca Silva
Autoria: Goiânia e Belo Horizonte compartilham alguns fatos em comum: foram cidades planejadas como novas capitais dos estados de Goiás e Minas Gerais, respectivamente; possuem uma narrativa de modernidade que são transcritas em seus edifícios, prédios, monumentos, toponímia, conjuntos arquitetônicos. Atualmente, os centros dessas capitais passam por processos de revitalização, requalificação e tombamento de alguns de seus elementos, criando uma atmosfera histórica para o turismo e outras apropriações do capitalismo contemporâneo. As propostas de Circuito Cultural com a criação de museus nos antigos edifícios públicos são encontradas nas duas cidades, com funcionamento já estruturado na capital mineira (Praça da liberdade), e com o projeto em vistas de execução na capital goiana (Praça cívica). Ambas as praças possuem centralidade e localizam os respectivos palácios do governo estadual. Isso aumenta as possibilidades para o consumo cultural. De outro lado, esses espaços são cada vez mais segregados, de modo a impedir o acesso de pessoas em situação de rua, cada vez mais crescentes nesses centros. A luta por representações, as disputas simbólicas, ideológicas, envolvem a construção dos espaços (de memória), produzindo uma guerra de lugares entre os grupos de interesse diferentemente posicionados na estrutura social e em suas relações frente ao poder público. A coexistência de diferentes gerações, tradições, com vistas à preservação ou transformação e reestruturação social compõe este cenário de disputas materiais e simbólicas. É a modernidade que inaugura a necessidade de criação desses “lugares de memória” (NORA, 1993), tais como os monumentos, os museus, a fim de delimitar uma história e, principalmente, um sentido de futuro, de destino, de devir (CHOAY, 2008). Nesse sentido, a preservação patrimonial acontece num jogo político, de interesses, não neutro. Isso é evidente nas políticas para o patrimônio a nível nacional. De modo semelhante, na construção dos regionalismos e distinções locais, fundamentais num país territorialmente continental como o Brasil, a construção das identidades locais acontece nas regiões e estados. No que concerne a Goiás, pretendemos investigar de que forma o Monumento ao Bandeirante contribui nesse processo de formação de uma identidade goiana. A partir da leitura do Monumento ao Bandeirante e do acervo documental existente sobre ele, cabe investigar se o destino goiano cruzaria o paulista, como um espelho de modernidade, uma vez que sua origem coincide com as bandeiras dos primeiros povoados. No caso de Minas Gerais, tomaremos o Obelisco localizado na Praça Sete para investigar os processos de construção de uma identidade mineira, republicana, afeita aos discursos da independência, emancipação e modernidade.
O PATRIMÔNIO SERVE À CIDADE COMO NEGÓCIO? O caso do Museu Cais do Sertão, em Recife, Pernambuco.
Autoria: Francisco Sá Barreto, Izabella Medeiros
Autoria: Este work é parte de projeto de pesquisa que desenvolvemos desde o final de 2014, a partir do qual procuramos entender a simbiose entre os discursos de modernidade e tradição em três recortes temporais específicos na cidade de Recife, Pernambuco. O terceiro recorte trata dos embates entre o Projeto Novo Recife e as iniciativas de resistência a ele, mas não somente a ele. Foi possível observar, ao logo dos estudos que já realizamos, o funcionamento das estratégias para tradução da resistência pontual ao Novo Recife a um debate sobre a cidade e suas políticas de gestão como um todo. É o que procuramos observar quando nos dedicamos a compreender a atuação do Movimento Ocupe Estelita ou do Grupo de Direitos Urbanos nesse cenário. No outro lado da querela, por sua vez, encontra-se um conjunto de políticas de intervenção sobre as regiões do centro antigo da cidade do Recife (Bairros do Recife, São José e Santo Antônio), as quais funcionam como paradigma para um tipo de operação sobre a cidade que já vigora desde o próprio projeto urbano de modernização do Recife, ainda no final do século XIX e início do XX. Procuramos observar o funcionamento desse conjunto de intervenções para além do interesse em tornar “novamente disponíveis” para a habitação zonas inteiras há muito abandonadas na cidade. O que, contudo, os textos do PNR (Projeto Novo Recife) chamam de zonas abandonadas? O que significam, nesse contexto, “tornar novamente disponíveis”? Mais do que investir na construção de grandes edifícios, que estimulam firmemente a especulação imobiliária na região, alimentando as demandas das grandes construtoras locais, o conjunto dessas intervenções identificou, desde o princípio, na “reforma da cultura” o mais destacado empreendimento no tempo da revitalização urbana do Recife. Desde os anos 1990, a construção de um “novo” habitus cultural para a região procura estimular a zona como objeto do interesse do mercado do turismo global, bem como uma alternativa economicamente promissora de entretenimento da cidade. Na primeira década do século XXI, esse conjunto de intervenções ganha o reforço de grandes edificações dedicadas ao consumo cultural, especialmente dois equipamentos que celebram parcerias entre a gestão do Estado e a iniciativa privada: no Paço do Frevo e o Museu Cais do Sertão. Totalizando mais de R$ 50 milhões em investimentos públicos, os dois equipamentos representam, antes de um interesse da gestão em estimular a divulgação e preservação do patrimônio local, um promissor negócio da cultura em sintonia com tendência verificada em todo o globo. A essa altura, serve ao negócio da cultura as contemporâneas políticas de preservação do patrimônio cultural nas cidades contemporâneas? Essa é a questão que, neste work, pretendemos desenvolver.
Projeto do novo Edifício São Pedro - Uma nova dimensão de preservação na Cidade da Fortaleza?
Autoria: Marcelo Mota Capasso
Autoria: Esta contribuição faz parte de pesquisa em desenvolvimento no âmbito da Geografia Urbana e Patrimônio Cultural, com ênfase nos aspectos que orientam as decisões em planejamento urbano e suas implicações na preservação dos monumentos históricos e suas paisagens envoltórias. Alguns casos na cidade de Fortaleza-CE, chamam a atenção pelo discurso patrimonializante associado aos interesses do mercado imobiliário. Apesar da inclusão de novos bens imóveis e criação de um zoneamento urbano especial de patrimônio cultural edificado para a cidade, no fim dos anos 2000, a política municipal de preservação entrou em estancamento, aparentemente injustificado, encontrando o discurso patrimonial pouco lugar na mídia formal. O avanço da inserção da cidade no capital financeiro imobiliário internacional, alavancado pela indústria do turismo, influiu na recente alteração da legislação urbanística, aumentando-se o direito de construir em mais de 20% do município. É emblemático o caso do Edifício São Pedro, de arquitetura histórica, na Praia de Iracema. Tombado, já há alguns anos, pelo conselho local de patrimônio cultural, o COMPHIC, até hoje a medida não encontrou respaldo em decreto do prefeito. A negociação entre poder público, representantes da sociedade civil e proprietários levou à apresentação de um projeto de “recuperação”, cuja realização se justificaria economicamente apenas com a implantação de uma nova torre envidraçada por sobre o edifício São Pedro, e cuja possibilidade construtiva apenas se efetivaria com a sua destruição material (quase) total, substituído por um simulacro. Em uma cidade onde a manutenção dos ícones memoriais urbanos (sociotransmissores) encontra pouca representação entre movimentos sociais, reféns de necessidades emergenciais de moradia, pela titulação da posse e enfrentamento do trator imobiliário, é importante notar como o discurso da preservação do São Pedro se converte em oportunidade imobiliário para seus incorporadores. Serão dadas quase três vezes o direito de construir permitido em lei, forma simbólica de compensação àquele proprietário “amaldiçoado” pelo tombamento, atropelando todo o marco jurídico-urbanístico que rege a preservação do edifício e seu entorno, seja o Decreto Federal 25/1937 ou o Plano Diretor da cidade. A não inclusão do edifício no zoneamento especial de patrimônio histórico reflete a estratégia (Certeau) concertada em torno da justificativa, de visão totalizante, que inclui um “novo” São Pedro no “novo” espaço planejado da frente marítima, junto com uma roda gigante, um aquário público e uma operação consorciada imobiliária entre a Praia Formosa e a Praia de Iracema, sem ainda oferecer destino à comunidade do Poço da Draga, ocupação residencial remanescente entre a praia e a cidade formal.
Turismo e esporte na peregrinação do Caminho de Santiago de Compostela.
Autoria: Rômulo Bulgarelli Labronici
Autoria: O presente work busca discutir a partir de uma experiência etnográfica realizada durante a travessia do “Caminho de Compostela”, situado na região da Galícia/ Espanha, o seu processo de caminhar como uma atividade que engloba uma tríplice perspectiva de sentidos: turísticos, religiosos e esportivos que se reconfiguram continuamente. Um caminho que se estrutura a partir de uma “malha” circuncêntrica que cobre grande parte da península Ibérica. Apesar disso, a chegada na basílica de Santiago não pode ser entendida como o objetivo último do caminhante, já que o processo de andar o caminho é que vai permitir que ele ultrapasse tais fronteiras liminares (TURNER, 2005, 2008). Ao peregrino, a fronteira da busca pela aproximação do sagrado, para o esportista a fronteira da superação individual do corpo e mente, e para o turista a fronteira da experiência habitual e do desconhecido. A viagem pode ser entendida como uma forma de ritual, na qual o viajante sai de sua rotina e tem uma experiência “extraordinária”, liminar e, após esse período, retorna ao seu mundo cotidiano de certa forma transformado. Se por um lado, a noção de “Turista” absorve no campo uma conotação negativa, relacionada a esfera do consumo, sendo sua figura apresentada como “superficial” ou “inautêntica”. Por outro, a noção de “peregrino” é exacerbada devido não só ao caráter de ruptura do cotidiano, mas, principalmente, devido à maneira “crítica” de se colocar, que é característica, na qual o despojamento material é condição para vivenciar a experiência. Por fim, trago na inspiração no conceito de “peregrinação”, tal qual abordado por Tim Ingold (2015) como um processo de crescimento dentro de um campo de relacionamentos, no qual o Caminho de Santiago mimetiza o movimento da vida que cada indivíduo realiza com seus próprios pés.
“ENTÃO BRILHA!” BLOCO DO CARNAVAL DE RUA DE BELO HORIZONTE: aproximações entre a cidade e o design
Autoria: Wânia Maria de Araújo, Henrique de Oliveira Neder
Autoria: Este work buscará investigar as aproximações entre a cidade e o design a partir do estudo do bloco de carnaval de rua “Então Brilha” que desfila na região denominada de Baixo Centro em Belo Horizonte. A cidade é pensada aqui como um texto a ser lido como forma de compreensão das interações sociais que nela têm lugar e dos sujeitos que delas fazem parte. Observar a cidade durante o carnaval torna possível que fiquemos diante de novas cenas sociais, de reconfigurações espaciais, de uma diversidade ainda maior de atores sociais presentes nos espaços da cidade. Os blocos de carnaval independentes de Belo Horizonte surgiram a partir de 2009 e um destes blocos é o “Então Brilha!” que inicia o percurso do desfile na Rua dos Guaicurus, “também conhecida como a zona do baixo meretrício” (AMÉLIO, 2015, p. 238). As cores contratantes do bloco: o dourado e o rosa, remetem ao clima alegre e criam a impressão de que todos, de alguma forma, podem brilhar. Propõe questionamentos acerca das minorias e traz à tona também a diversidade ao reunir as diferenças de maneira sobreposta num mesmo lugar: a rua. O design nesta pesquisa será compreendido como uma intervenção cultural no espaço. Isso implica pensar o design como mais um elemento que propicia mudanças no espaço e que essas mudanças podem ser lidas, compreendidas como a construção da cultura que tem a cidade como cenário e como ator. Partindo desse pressuposto já torna possível articular a cidade e seu espaço urbano com o design e, por fim, ainda conectar essa relação com o conceito de cultura. Cultura aqui compreendida como uma teia de significados, tal como enunciado pela antropologia interpretativa de Geertz (1989). Com efeito, a proposta da investigação é verificar em que medida e de que forma o design está presente na cena urbana contemporânea do Baixo Centro de Belo Horizonte durante o carnaval, em especial no bloco “Então Brilha!”. Como este bloco de carnaval, considerado também uma intervenção cultural que faz seu desfile no Baixo Centro, tem se constituído, buscado se expressar e como tem impresso marcas na urbanidade de Belo Horizonte. Para tanto, pretende-se caminhar e observar o Baixo Centro (antes e durante o carnaval) para remontar o percurso do bloco realizando anotações e registros imagéticos em relação ao design urbano, às características do percurso, aos atores sociais, às atividades presentes antes e durante o carnaval. Com isso pretende-se verificar como o Baixo Centro de Belo Horizonte se remodela em virtude da passagem do Bloco “Então Brilha” a partir das diferentes atividades, interações e atores sociais, adereços, alegorias presentes dentro do bloco, nas ruas e espaços por onde desfila contribuindo para a modificação da relação dos sujeitos urbanos com os espaços da cidade.
“Visit Margate”: turismo, memória e nacionalismo no litoral inglês
Autoria: Ana Carolina Barreto Balthazar
Autoria: A partir de mais de dois anos de pesquisa etnográfica, o presente work discute o uso da memória e de narrativas sobre o passado para a transformação da cidade de Margate no litoral inglês em um conhecido destino turístico internacional. Em meados do século XX, as classes trabalhadoras de Londres costumavam ir para Margate passar as férias. Com as mudanças econômicas e, consequentemente, socio-geográficas sofridas pelo país no final do século passado, Margate passou a enfrentar uma forte crise. Buscando “regenerar” a cidade, o governo local e alguns habitantes atualmente investem em um plano estratégico para reposicionar a região enquanto importante destino turístico internacional. O presente artigo discute como tais estratégias envolvem “regimes de historicidade” (Hartog 2003) bastante específicos que desafiam a sensação de “pertencimento” (Cohen 1981; Degnen 2012; Edwards 1998; Lovell 1998; Strathern 1981) de alguns moradores aposentados da região. Para atrair turistas estrangeiros, uma galeria de arte contemporânea foi inaugurada em 2011 e nomeada Turner Contemporary, em homenagem ao famoso pintor inglês. Além disso, associações locais investiram na reforma e reabertura do histórico parque de diversões da cidade, a Dreamland. Ainda que ambas as iniciativas se conectem com elementos importantes do passado britânico e da memória dos habitantes locais, enquanto produto para consumo de turistas internacionais esse passado se torna desconectado da rotina dos moradores de Margate. Em outras palavras, celebrar o passado se torna um elemento de um longo calendário de eventos turísticos ao invés de compor os ritos cotidianamente experimentados e reforçados pelos habitantes. Diante de tal conjuntura, esses moradores estranham o investimento em instituições “feitas para outras pessoas” – os estrangeiros – e atuam politicamente para defender as suas próprias apropriações e narrativas sobre o passado – por exemplo, através do voto pelo “Brexit” (a saída do Reino Unido da União Européia). Em Margate o passado não é apenas um imaginário vendido a turistas estrangeiros, mas compõe as narrativas nacionalistas que permeiam as casas, lugares e “materialidades” (Gonçalves 2013; Ingold 2000; Keane 2007; Miller 1987).